Um Filme de ROBERT ZEMECKIS
Com Michelle Pfeiffer, Harrison Ford, Diana Scarwid, Joe Morton, etc.
EUA / 130 min / COR / 16X9 (2.35:1)
Estreia nos EUA a 21/7/2000
Estreia em PORTUGAL a 20/10/2000
Claire: "Something is happening in our house! Whether you like it or not!"
«Sob a sombra de Hitchcock» - eis o subtítulo que, creio, todos aceitaremos de ânimo leve para este filme. No entanto, julgo que essa filiação está longe de esgotar o brilhantismo de "A Verdade Escondida". Dito de outro modo: creio que estamos perante um magnífico exercício classicista, um conto negro sobre o espaço conjugal e os seus fantasmas. Tudo passa, obviamente, pela personagem de Michelle Pfeiffer (e pela sublime Michelle Pfeiffer). É a partir do seu olhar que o mundo se organiza, ou melhor, se desorganiza - Zemeckis constrói todo o seu filme como um espaço ameaçado em que nunca se sabe muito bem o que poderá surgir na imagem seguinte, ou mesmo no interior de cada imagem. Se me é permitido ser didáctico, diria que estamos perante uma lição magistral de: como enquadrar; como fazer durar uma imagem; como utilizar os sons (incluindo a música) no interior das imagens; como filmar os actores e os seus gestos; enfim, como lidar com a ilusória transparência do mundo.
É, além do mais, um filme desassombradamente popular, no sentido em que recupera formas tradicionais de espectáculo sem para isso procurar justificações estetizantes ou assumir uma qualquer postura revivalista. O que aqui se celebra é o cinema como forma de ocupação do espaço e mecanismo de reconversão do tempo - coisas raras, coisas preciosas. Este filme é uma espécie de "Psycho" do fim de milénio. Robert Zemeckis, um dos realizadores que soube manter e, de certo modo, inovar as tradições hollywoodescas, apropria-se totalmente do estilo do mestre, não se importando de o plagiar abertamente ao mesmo tempo que o homenageia. Isto apesar de ser introduzida uma vertente fantástica, ausente dos filmes de Hitchcock, e que aqui ajuda à dimensão sobrenatural do filme. É pois quase inevitável sentir a presença tutelar do mestre do suspense e sermos dominados por ela.
Estamos assim perante um óptimo entretenimento (brilhante o estudo ao pormenor de cada enquadramento, cada acontecimento) a que só falta uma história mais fulgurante e uma maior densidade das personagens para ser um filme excelente. De sustos, estamos conversados. Mesmo sendo previsíveis, os saltos na cadeira são mais que muitos e chegam a ser angustiantes os travellings premonitórios de mais terror. Dos actores, tem que se destacar indubitavelmente a belíssima Michelle Pfeiffer que tem aqui um dos seus melhores desempenhos. É magnífica, mesmo na mais pequena nuance psicológica.
Tecnicamente é também um filme quase perfeito. Da montagem à fotografia, passando pela óptima partitura de Alan Silvestri, que nalguns momentos se transforma literalmente em Bernard Herrmann, para mais alguns arrepios nossos. O seu estranho sabor de filme clássico deixa-nos um pouco perplexos, até pela falta de originalidade. Por aqui passam, para além de diversos filmes do já citado Hitchcock, demasiadas semelhanças com "Atracção fatal" ou "Shining", mas é um divertimento de primeira água. Somos manipulados, mas felizes por sê-lo.