quinta-feira, outubro 25, 2012

HAROLD AND MAUDE (1971)

ENSINA-ME A VIVER OU A HISTÓRIA DE HAROLD E MAUDE
Um filme de HAL ASHBY


Com Ruth Gordon, Bud Cort, Vivian Pickles, Cyril Cusack, Charles Tyner

EUA / 91 min / COR / 16X9 (1.85:1)

Estreia nos EUA a 20/12/1971
Estreia em MOÇAMBIQUE a 13/10/1972
(LM, Estúdio 222)



«Well if you want to sing out, sing out
and if you ant to be free, be free
there’s a million things to be, you know there are»
(Cat Stevens)

“It has an amazing history. Anywhere I’ve ever gone, you name it, people have walked up and said, «I have to talk to you about this movie.» It’s a nice way to meet people”
(Bud Cort)

Um dos filmes-chave do início da década de 70, esta comédia de humor negro acedeu por mérito próprio ao estatuto muito particular de objecto-raro. Percebe-se porquê. Hoje, tal como ontem, a rebelião continua a existir (felizmente...), e os alvos permanecem practicamente os mesmos: as forças policiais e militarizadas, a igreja e os seus derivados, ou ainda os estigmas de uma sociedade castrante, repleta de obrigações sociais e moralizantes. Ao fim e ao cabo, muito pouca coisa de essencial mudou nestas quatro décadas, motivo pelo qual este filme se mantém tão actual.
“Harold and Maude” (“Ensina-me a Viver” na tradução continental portuguesa, já que em Moçambique apareceu nas salas como “A História de Harold e Maude”) é um daqueles filmes cujo enredo não faz grande sentido contar. Um jovem de 20 anos, fã de cemitérios, simulador de suicídios e que se apaixona por uma velhota de 80? Julgo que hoje, tal como há quarenta anos atrás, seriam premissas mais do que suficientes para retirar público das salas de cinema. E assim começou efectivamente por acontecer quando o filme se estreou nos Estados Unidos a 20 de Dezembro de 1971 – foi um autêntico flop no box-office.
Mas depois, pouco a pouco, as pessoas começaram a falar do filme, a passar palavra, a quererem que os amigos mais chegados pudessem usufruir também da pequena felicidade que era assistir durante hora e meia àquela original história. E a “corrente” foi crescendo, alargando-se cada vez mais, até tornar “Harold and Maude” naquilo que ele nunca mais deixou de o ser: um genuíno filme de culto, daqueles a que de tempos a tempos somos obrigados a voltar quando a falsidade em nosso redor volta de novo a tomar proporções insuportáveis.
De algum modo é um filme na linha de um “Graduate”: o mesmo desajustamento social, a mesma procura das coisas importantes da vida fora do núcleo familiar. Aliás, uma temática que nos era muito familiar naquele virar de década, onde as rupturas com o establishment e o politicamente correcto eram o pão nosso de cada dia. E talvez resida aqui algum do desfasamento do filme face à realidade dos nossos dias – é que, contrariamente à minha geração, a juventude de hoje não denota a mesma ânsia de libertação do seio familiar, parecendo que iniciam a sua fase adulta de dentro para fora e muito mais tarde. Por essa razão temo que “Harold and Maude” não seja compreendido pelas faixas etárias mais novas, pelo menos com o mesmo entusiasmo de há 40 anos atrás.
“Harold and Maude” é muito mais do que uma história de amor entre uma octogenária e um jovem de 20 anos, como muito boa gente referiu na altura da estreia. É evidente que a relação está lá, não pode ser ignorada, mas o filme apenas a usa para outros voos, muito mais altos e diversificados. Na sua essência estamos perante uma sátira social adornada de um humor negro muito peculiar. Hal Ashby, o realizador, soube manter a corda bem esticada entre o privado e o político, a comédia e o sentimentalismo, o grotesco e o banal, orquestrando uma balada, uma alegoria de vida e morte em que esta última acaba por ser a força redentora que liberta a primeira. Ou seja, para que Harold possa "começar a viver" Maude tem de lhe oferecer o sacrifício supremo, renunciando a essa mesma vida para desse modo o poder libertar, apesar de, em certo sentido, ter passado a fazer parte dele:
and if you want to be me – be me
and if you want to be you – be you
cos there’s a million things to do
you know that there are”
Com um argumento brilhante da autoria de Collin Higgins, “Harold and Maude” inicia-se e acaba com encenações da morte. Mas se a primeira (e todas as outras ao longo do filme) apenas visa mostrá-la enquanto reflexo oposto de sinais vitais (como que um espelho no qual a mãe de Harold se possa contemplar de vez em quando) a última é a encenação definitiva, em que o espelho é quebrado e a liberdade enfim emerge, como consequência directa de uma morte já autêntica e não imitada – uma espécie de ritual, de morte libertadora.
Bud Cort e Ruth Gordon foram ambos nomeados para os Globos de Ouro de 1972, tendo Hal Ashby ganho o prémio da melhor realização no Festival Internacional de Cinema de Valladolid de 1974 por esta sua segunda longa metragem. Viria ainda a realizar alguns filmes importantes até ao fim dos anos 70 (casos de “Bound For Glory” em 1976 ou “Coming Home” em 1978) mas a partir do início dos anos 80 o seu trabalho foi perdendo interesse. Viria a falecer a 27 de Dezembro de 1988, de cancro no fígado, aos 59 anos. Ruth Gordon tinha 75 anos quando desempenhou o papel de Maude e viria a falecer de ataque cardíaco a 28 de Agosto de 1985, com 88 anos.

“What was more interesting was, I’d done that project, I’d think of put it behind me. But then, over the years it’s just taken on so much importance. It’s a milestone, and a part of people’s memories, which they love… and I love it too. Other things disappear or assume smaller proportions. “Harold and Maude” just gets better and means more and more. It’s the rarest thing. A film that gets better with age”
(Yusuf Islam, aka, Cat Stevens)
Um dos grandes trunfos do filme foi sem dúvida a sua banda sonora, composta pelas canções de Cat Stevens, na altura a viver o seu apogeu criativo. Essas canções ajustam-se que nem uma luva às imagens quer através das letras quer musicalmente. E o mais curioso é que a grande maioria foi retirada de dois albuns já existentes no mercado: “Mona Bone Jakon” e “Tea For The Tillerman”, ambos de 1970. As duas únicas novidades, compostas expressamente para o filme foram os temas “Don’t Be Shy” e “If You Want To Sing Out, Sing Out”.

 

Dada a edição recente daqueles dois albuns, não foi considerada importante na altura a saída de um novo album com a inclusão completa das canções que apareciam no filme. Apenas no Japão apareceu uma pequena edição pirata rotulada de banda sonora que rapidamente desapareceu da circulação para desgosto de possíveis coleccionadores. Em meados da década de 80 aqueles dois temas apareceram por fim editados legalmente no 2º Volume dos “Greatest Hits" de Cat Stevens. Mas não era isso que os verdadeiros fãs queriam. Esses queriam uma verdadeira banda-sonora do filme, com as palavras “Harold”, “Maude” e “Soundtrack” estampados na capa.
Tivemos todos de esperar 37 anos, tempo mais do que suficiente para Cat Stevens ter mudado de nome, trocado as luzes da ribalta pelo recolhimento religioso e ter por fim regressado à gravação de novas canções. Mas a espera é capaz de ter valido a pena. Numa altura em que os tempos do vinil estão pouco a pouco a regressar, o aparecimento de uma edição especial para colecionadores nos fins de 2007 representou a concretização de um sonho já muito antigo. A edição foi limitada (apenas 2,500 unidades) pelo que rapidamente se esgotou. Felizmente consegui a minha cópia a tempo (apesar de ter dispendido quatro vezes mais do que o preço "oficial") e ela aqui está, em todo o seu esplendor.
O autor deste projecto chama-se Cameron Crowe, um coleccionador obsessivo de bandas-sonoras e também escritor, director, produtor e arquivista em part-time, que durante os últimos três anos meteu mãos à obra, ajudado pela sua própria editora, a Vinyl Film Records, e também pela Paramount, que produziu o filme. E, claro, contou também com a ajuda do Senhor Yusuf Islam, o regressado Cat Stevens. O resultado (Vinyl Films VFR-2007-3) é excelente!
Desde logo a inclusão óbvia de todos os temas, incluindo versões alternativas e instrumentais, e prensados em vinil colorido, com oito cores diferentes à escolha (a minha cópia é em rosa claro-escuro). Vem também incluído um single de 7 polegadas com versões demo dos dois temas extras, também impresso em vinil colorido (no meu caso é branco) e acompanhado de uma pequena folha manuscrita com as letras das duas canções. Isto tudo vem inserido num dos lados da dupla capa (gatefold), a qual, no seu interior, apresenta uma montagem fotográfica de uma série de imagens relacionadas com o filme: livros, fotos, bilhetes, contas, singles, posters, enfim, uma autêntica parafernália de “Harold and Maude”.
 
No outro lado da capa encontra-se um grande envelope onde se pode ler “Harold & Maude Publicity Kit 25 Stills”, que é uma cópia do envelope na altura enviada à imprensa com fotografias para promoção do filme. No interior encontramos um catálogo com 36 páginas, recheado de fotografias originais e com histórias, curiosidades (sabiam que Elton John chegou a ser abordado para o papel principal?) e depoimentos de todos quantos estiveram envolvidos na produção do filme. A finalizar dois posters gigantes, um de Cat Stevens, a preto e branco, e outro com o poster a cores da edição japonesa do filme.


4 comentários:

Silly Little Wabbit disse...

Acrescentaria só na referência à filmografia posterior a Harold and Maude de Hal Ashby o filme Being There com o excelente Peter Sellers.

Rato disse...

Óptimo filme sem dúvida - o último do hilariante Peter Sellers

ANTONIO NAHUD disse...

Uma ótima comédia. A Ruth Gordon, como sempre, rouba a cena.

O Falcão Maltês

Jorge Ramiro disse...

Meu autor favorito é Charles Chaplin. Pode não ser um o mais intelectual, mas eu acho que ele sempre promoveu uma mensagem de consciência crítica e ele é um pioneiro em seu tempo. Eu não sou um profissional, o trabalho com a distribuição de ração Eukanuba, mas eu adoro os filmes.