Um filme de SERGIO LEONE
Com Claudia Cardinale, Henry
Fonda, Jason Robards, Charles Bronson, Gabriele Ferzetti, Paolo Stoppa, Woody
Strode, Frank Wolff, Keenan Wynn, etc.
ITÁLIA-EUA-ESPANHA
/ 165 min /
COR
16X9 (2.35:1)
Estreia
em ITÁLIA: 21/12/1968
Estreia
nos EUA: NY, 28/5/1969
Estreia
em PORTUGAL: 31/3/1970
Frank:
«Keep your lovin' brother happy!»
Encomenda aceite por Sergio Leone como condição necessária
para que lhe fosse autorizada a realização do projecto “Once Upon A Time In
America” (filme que seria a sua derradeira obra, já nos anos 80), este
western-súmula de todos os westerns viria a tornar-se um dos mais amados
clássicos do género. Escrito por Bernardo Bertolucci, Dario Argento e o próprio
Leone, como homenagem aos westerns mais célebres da história (onde pontificam,
pela referência mais óbvia, “High Noon”, “Johnny Guitar”, “The Last Sunset”,
“My Darling Clementine” ou “The Iron Horse”, entre várias dezenas de outros
filmes), “Once Upon A Time In The West” viria a tornar-se, porém, num western
completamente atípico, onde os diversos personagens estão envolvidos num véu de
mistérios sombrios, que seriam paulatinamente revelados ao público durante o
decorrer da história. Ou seja, contrariamente ao que se possa pensar, Leone não
se limitou a decalcar situações já existentes em outros filmes, mas, pelo
contrário, reinventa-as dentro do seu estilo muito particular.
Filme lento e contemplativo (sugerindo “os últimos suspiros”
antes da morte, como Leone o caracterizava), rodado em cenários inóspitos do
Utah (no Monument Valley, onde muitos filmes de John Ford foram feitos) e de
Almeria, no sul de Espanha (onde a cidade de Flagstone foi erigida), “Aconteceu
no Oeste” é um autêntico bailado operático, onde a música de Morricone e as
imagens de Tonino Delli Colli coreografam sequências admiráveis em que a
lentidão de processos atinge picos inusitados de uma beleza sufocante, raras
vezes transmitida com tamanha carga hipnótica de encantamento. «Para mim»,
disse Leone na altura, «a banda sonora é o verdadeiro diálogo do filme. Nesse
sentido, Ennio é o meu melhor argumentista». Cheio de razão, o genial cineasta
italiano.
Na realidade, e contrariamente ao usual procedimento em
cinema, Morricone compôs toda a partitura (um tema distinto para cada personagem)
antes até das filmagens se iniciarem, o que permitiu que a música acompanhasse
ao vivo a maior parte da rodagem. Daí talvez a explicação pela sensação
constante de estarmos perante um espectáculo de acentuado cunho operático.
Mesmo quando a música é substituída por sons, como na inesquecível sequência de
abertura, onde durante cerca de 15 minutos somos como que hipnotizados por
aquilo que se passa (ou não se passa) no écran.
Assim, e uma vez mais, Leone prefere contar a sua história através de
meios essencialmente visuais, o que só engradece a obra em termos cinemáticos
(na maior parte dos grandes filmes da história do cinema pode-se constatar esta
preferência pelo olhar, em detrimento da palavra).
No que diz respeito ao elenco, Leone desenvolveu pela
primeira vez um personagem feminino forte, à volta do qual todo o filme se
constrói, e a que Claudia Cardinale transmite uma dimensão épica de pioneira do
novo oeste. Ela é Jill McBain, apelido conseguido através do casamento recente
com Brett McBain (Frank Wolff), por procuração. Antiga prostituta, vinda de New Orleans com o
intuito de refazer a vida, mas que à sua espera tem os corpos do novo marido (e
dos seus filhos) brutalmente assassinados. Jason Robards está magnífico como
Cheyenne, um pistoleiro cansado e já desencantado pela vida, e Charles Bronson
nunca foi filmado desta maneira em toda a sua carreira; a gaita de beiços que
ele toca persistentemente, como augúrio de desgraças – e que dá nome ao seu
personagem (“Harmonica”) – tornar-se-ia, ela própria, um instrumento fétiche do
filme. Mas a grande surpresa é sem dúvida Henry Fonda, que aqui cria uma das
figuras mais sádicas da história do cinema, ele que até então personificava
sempre os maiores heróis americanos. De tal modo a sua interpretação foi
conseguida que a cena do assassínio da criança foi sistematicamente cortada em
todas as exibições comerciais do filme nos Estados Unidos. É que os americanos
sempre gostaram muito de preservar os seus mitos pessoais...
Como seria de esperar, o filme foi na altura da sua estreia
um autêntico fracasso, até porque nesse final dos anos 60 o western estava já
morto e enterrado. Sobretudo nos Estados Unidos, onde mais uma vez uma obra de
arte foi mutilada (em cerca de 20 minutos) em nome do comércio e do lucro
fácil. A versão completa foi apenas exibida em França, onde, aí sim, o filme
começou a ganhar rapidamente um público fiel que o iria transformar num objecto
de culto e arte. Hoje, e como geralmente o tempo é bom conselheiro, “Aconteceu
no Oeste” figura quase sempre nas listagens dos melhores filmes de sempre,
tendo mesmo um lugar cativo no Top 10 dos melhores westerns. Partilho essa
preferência, ao ponto de o considerar pessoalmente o melhor western de todos os
tempos, e um dos filmes mais belos da história do cinema.
A edição especial de coleccionador vinda a público em duplo
DVD (e mais recentemente em blu-ray) é um pequeno tesouro para todos os fans do
filme, porque para além da completa e magnífica remasterização digital
efectuada, oferece-nos ainda uma série de extras, entre os quais se destacam um
trio de documentários (legendados em português) sobre a produção, o realizador
e o elenco e também um comentário áudio brilhante do historiador de cinema Sir
Christopher Frayling (onde transparece toda a fascinação sentida pela obra em
análise) ao qual se juntam também outras pessoas ilustres da sétima arte: John
Carpenter, Bernardo Bertolucci, John Milius e até a própria Claudia Cardinale.
CURIOSIDADES:
- Al Mulock, que interpreta um dos três pistoleiros da
sequência de abertura, veio a suicidar-se durante as filmagens, tendo-se
atirado da janela do hotel onde os actores e técnicos se encontravam hospedados
(localizado em Guadix, a cerca de 80 km de Almeria). O actor tinha perdido a
mulher um ano antes, vítima de cancro, tendo-se tornado viciado em drogas desde
essa altura.
- O futuro realizador John Landis participou como duplo
neste filme.
- Henry Fonda, que de início não queria entrar no filme, foi
convencido por Leone que o queria pela primeira vez a interpretar um personagem
malévolo, nada condizente com a imagem a que o actor tinha habituado o seu
público. Como consequência, o cinema ganhou para o seu album de memórias, um
dos mais frios e sinistros vilões da história. Outro pormenor, ilustrativo da
perspicácia de Leone, foi o facto do realizador querer aproveitar a cor dos
olhos do actor, o qual pretendia usar lentes de contacto para os escurecer.
- Mais de metade do orçamento do filme foi gasto no
pagamento dos salários dos actores.
- Leone pretendia reunir os três actores de " The Good,
The Bad and The Ugly" (Clint Eastwood, Lee Van Cleef and Eli Wallach) para
interpretarem apenas a célebre sequência inicial (sendo mortos por Harmonica ao
fim dos primeiros 15 minutos). Mas dada a indisponibilidade de Clint Eastwood
abandonou a ideia.
- A filmagem do duelo final entre Frank e Harmonica é
practicamente decalcada da que consta no filme de Robert Aldrich, “The Last
Sunset” (entre Rock Hudson e Kirk Douglas), filme de que Bernardo Bertolucci
era grande fã.
- Charles Bronson foi a terceira escolha para o papel de
Harmonica, depois de Clint Eastwood e James Coburn o terem recusado. Esatwood
por se encontrar indisponível e Coburn por ter exigido muito dinheiro.
- Quando a equipa de filmagens chegou a Almeria encontrou
grandes pilhas de madeira, deixadas no local desde que em 1965 Orson Welles aí
tinha rodado o filme “Falstaff”. Essas madeiras foram aproveitadas para erigir
a plataforma onde decorre o início do filme e também na construção da cabana do
rancho de Brett McBain. Esse local foi preservado, com o nome de “Rancho
Leone”, e ainda hoje se encontra aberto ao público. Quem passar por Almeria…
- As filmagens concluíram-se nos finais de Julho de 1968,
tendo totalizado 110 dias.