Um filme de OTTO PREMINGER
Com Gene Tierney, Dana Andrews, Clifton Webb, Vincent Price, Judith Anderson
EUA / 88 min / PB / 4X3 (1.37:1)
Estreia nos EUA a 11/10/1944 (New York)
Waldo Lydecker: "I'm not kind, I'm vicious. It's the secret of my charm"
Dos grandes cineastas revelados na década de 40, Otto Preminger terá sido um dos que mais me decepcionou ao longo dos anos, sobretudo a partir do início da década de 60, durante a qual realizou alguns filmes a roçar mesmo a mediocridade (recorde-se por exemplo “Exodus” ou “O Cardeal”). Mas tal não será razão suficiente para que se lhe retire os devidos méritos, nomeadamente o seu notável sentido de “mis-en-scène” na direcção de actores, uma das características que mais identificam o seu cinema.
Nascido em Viena d’Austria, a 5 de Dezembro de 1906, Preminger cursou direito e filosofia, mas logo aos 17 anos teve o primeiro contacto com o mundo do espectáculo como actor. Em 1924 começou a trabalhar com Max Reinhardt, o que o não impediu de se formar em direito em 1926. Nesse mesmo ano substituiu Reinhardt na direcção do Josefstadt Theatre e durante os cinco anos seguintes dirigiu mais de 50 peças de teatro, tornando-se um dos primeiros nomes da cena germânica. Toda essa experiência de palco ir-se-ia reflectir nos seus filmes, rodados já em solo americano, para onde emigrou em 1936, quando a proximidade dos nazis o começou a incomodar.
Cronologicamente, “Laura” é o terceiro filme de Preminger (após “Margin For Error” e “In The Meantime, Darling”) mas pela sua importância é verdadeiramente o início do seu reconhecimento quer junto ao público quer junto à crítica. É uma obra incontornável do thriller e do film noir, e que permanece até hoje como o título mais emblemático da sua carreira. Pessoalmente considero-o algo sobrevalorizado, até porque grande parte da sua fama se deve à presença encantatória de Gene Tierney, que nunca esteve tão sublime como neste filme.
Outra das características de Preminger, presente quase sempre nas suas obras mais importantes, é o jogo do “gato e do rato” com que se entretém a ludibriar o espectador. Quase sempre o que parece certo ou lógico tem outros significados, que pouco a pouco se vão descobrindo à medida que a acção se desenvolve. Nesse sentido “Laura” funciona quase como um cartão de visita de Preminger. Começa com adornos claros de um qualquer policial mas o talento do cineasta vai-o progressivamente transformando numa história romanceada onde o papel principal é conferido à obsessão de um inspector da polícia, primeiro por um retrato, depois pela mulher que lhe serviu de modelo e que subitamente reaparece, ressuscitada de uma morte previamente anunciada.
Como atrás referi, o grande trunfo de “Laura” é a presença fabulosa de Gene Tierney cujas imagens ficarão para sempre associadas ao filme, muito por causa também do excelente guarda-roupa de Bonnie Cashin, mas sobretudo devido à fotografia luminosa de Joseph La Shelle, que ganhou o Oscar da Academia na respectiva categoria. A célebre partitura musical, da autoria de David Raksin, fica-nos de igual modo no ouvido, servindo exemplarmente os propósitos de Preminger. Não fosse o argumento tão densamente recheado de diálogos (teatralizando em demasia o romance policial de Vera Caspary) e “Laura” ganharia certamente outro fôlego como obra cinematográfica.
- A primeira escolha para o papel de Laura foi a actriz Jennifer Jones, que o recusou. Hedy Lamarr foi outra das actrizes que também se esquivou. E só por obrigações contratuais é que Gene Tierney entrou no filme
- Um dos legados mais duradouros do filme é o tema musical, composto num fim de semana por David Raksin (que originalmente o apelidou de “Judy”, em homenagem a Judy Garland). No entanto Preminger queria usar o tema “Sophisticated Lady”, de Duke Ellington, depois de ver gorada a tentativa de comprar os direitos de “Summertime”, de Gershwin.
- “Laura” começou por dirigida pelo realizador Rouben Mamoulian. Otto Preminger, que o substituíu depois, começou logo por destruir todo o material entretanto filmado
- Para além do Oscar da melhor cinematografia, o filme foi ainda nomeado nas categorias de Realização, Argumento, Direcção Artística e Actor Secundário (Clifton Webb)
3 comentários:
Não concordo já sabes. Na minha opinião Laura é um dos melhores films noir já feitos ao lado de filmes como The Maltese Falcon do John Huston e do Out of the Past do Tourneur. E sim a Gene Tierney está assombrosa.
Gosto dessas tuas referências, Álvaro, mas no género prefiro o "Double Indemnity", do Billy Wilder, que talvez seja mesmo o meu film noir de eleição.
No "Laura", e tal como referi, é o excesso de diálogos que limita um pouco o lado cinemático da obra. Para mim o cinema é isso mesmo, poder contar-nos uma história sem que a palavra seja muito posta em evidência (será por isso talvez que sou um fã incondicional do cinema mudo). Por exemplo, vi há dias outro Preminger, "Fallen Angel" que achei magnífico, por todo aquele clima que o filme nos consegue transmitir apenas pelo poder das imagens. E que belissimas mulheres que por lá se passeiam também, quer a Alice Fay quer a Linda Darnell. O Dana Andrews é que desempenha sempre o mesmo tipo de papel, eh eh eh.
Pois, o mal do Dana Andrews é aquela expressão que nunca muda(vá às vezes). Também gosto muito do Fallen Angel. O meu preferido do Preminger talvez seja o The Man With The Golden Arm ou o Anatomy of a Murder, mas nenhum destes é o típico noir. Agora Laura e Whirlpool esses sim são puros noir. Nunca vi o Double Indemnity, aliás, ainda vi poucos do Wilder (tenho de remediar isso).
O que me tentaste dizer foi que gostam de filmes onde se fala pouco. Eu também, mas encontras esse tipo de cinema mais facilmente na Europa e por aí fora. Actualmente recomendo (caso não conheças) Alonso, Bartas (o extremo, tem filmes onde não se fala), Sokurov...
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