sábado, novembro 27, 2010

TABU: A STORY OF THE SOUTH SEAS (1931)

TABU






Um filme de F.W. MURNAU




Com Matahi, Anne Chevalier, Hitu




EUA / 84 min / PB / 4X3 (1.20:1)




Estreia nos EUA a 1/8/1931
Estreia em Portugal a 25/1/1932
(Lisboa, cinema Tivoli)


F. W. Murnau foi provavelmente um dos poucos visionários do Cinema. Visionário do delírio e dos sonhos, febril na sua letalidade, nada nos seus filmes é dissociável, tudo se penetra e confunde numa complementaridade única. Cineasta da composição com uma incomparável plástica, rica e subtil, de minúcia excessiva, onde todos os recursos visuais e pictórios são explorados, a sua arte mistura, confunde, cruza os elementos, as imagens, o começo e o final de um destino. Mas o que ainda mais surpreende em Murnau é a inserção da natureza no drama, a riqueza das diversas simbologias numa atmosfera singular. Rever o seu cinema é constatar como na construção de um espaço fílmico era possível ver tanta coisa tão fascinante, e muitas vezes com adornos de uma grande sobriedade e despojamento, quer ao nível narrativo, cenográfico ou interpretativo.
Murnau morreu muito cedo, aos 42 anos, de braço dado com o desaparecimento do cinema mudo, não chegando portanto a colocar toda a sua criatividade ao serviço das novas modas. Uma escassa semana depois da conclusão deste seu último filme, o cineasta alemão radicado nos EUA encontraria a morte num desastre de automóvel, não assistindo já à sua estreia alguns meses depois. Na origem concebido como uma parceria com o documentarista Robert J. Flaherty, “Tabu” revelar-se-ia muito mais “murnau”, até porque o realizador não era homem de partilhar de ânimo leve as suas ideias sobre o cinema. Mesmo assim, o nome de Flaherty ainda figura nos créditos como co-autor do argumento e algumas passagens do filme, sobretudo na primeira parte, evocam uma certa atmosfera documental.
“Tabu” foi rodado inteiramente nos cenários naturais dos mares do sul, para onde Murnau se exilou após os conflitos havidos com os produtores do seu anterior filme, “Our Daily Bread” / “City Girl”. Dividido em duas partes, “Paraíso” e “Paraíso Perdido”, o filme tem por objectivo subjacente mostrar-nos o poder corrupto da chamada civilização sobre uma sociedade ainda imune e onde o hedonismo prevalece como doutrina orientadora dos prazeres da vida. No centro das atenções está a história de amor entre dois jovens ilhéus que têm de fugir para escapar ao castigo máximo imposto pela tradição. Sobre Reri (Anne Chevalier), a rapariga por quem o pescador de pérolas (Matahi) se perde de amores, recaía um tabu de conotação sexual por ter sido a escolhida para substituir uma donzela sagrada, acabada de morrer - tabu esse que é obviamente transgredido pelos dois apaixonados.
A fuga dos amantes para uma outra ilha onde as transações comerciais impõem já o poder do dinheiro está à partida condenada, até porque a ingenuidade de Matahi o levará a ser presa fácil desse novo mundo. Hitu, o ancião zelador pelo cumprimento das tradições ancestrais (mais uma das figuras sinistras da filmografia de Murnau, símbolo da opressão e da morte) acaba por descobrir o paradeiro dos dois jovens e levar consigo a bela Reri que assim se submete ao seu destino na esperança de conseguir salvar a vida do companheiro. Este ainda tenta perseguir a nado o barco que se afasta com a sua amada mas as forças vão-lhe faltando, acabando por se consumar a tragédia. O seu desaparecimento, lento e compassado, nas águas revoltas, é um momento pungente de invulgar beleza, que será para sempre associado à memória deste filme.
“Tabu” poderá estar longe das melhores obras de Murnau mas ainda assim é uma obra invulgar que terá o grande mérito de não ter equivalências na história do cinema e que 80 anos depois ainda conserva muito da sua frescura, dinamismo e inovação. A excelente cinematografia de Floyd Crosby (que por insistência de Murnau substituíu o próprio Flaherty como operador de câmara) foi devidamente recompensada com o respectivo Oscar. Apesar dos cortes feitos na altura da estreia (todas as cenas que mostravam alguma nudez foram elimindas) o filme revelou-se um sucesso junto do público, tendo estado em cartaz mais de 14 semanas numa sala de cinema em Nova Iorque.

POSTERS

2 comentários:

A Bola Indígena disse...

Os grandes clássicos americanos eram assinados por cineastas não americanos: Murnau, Wilder, Curtiz, Elia Kazan...

Cumprimentos

Billy Rider disse...

Nunca vi este testamento do Murnau, mas abriste-me o apetite...