Um filme de ALEXANDRE AJA
Com Cécile De France, Maïwenn Le Besco, Philippe Nahon, Franck Khalfoun, Andrei Finti, Oana Pellea
FRANÇA / 91 min / COR / 16X9 (2.35:1)
Estreia em França a 18/6/2003
Estreia nos EUA a 17/1/2004
(Sundance Film Festival)
Inédito comercialmente em Portugal
Marie: «Je ne laisserai plus jamais personne se mettre entre nous»
Segunda longa-metragem realizada aos 25 anos pelo francês Alexandre Aja, “Haute Tension” (“Switchblade Romance” na Grã-Bretanha) veio injectar novo sangue no género do horror, ao regressar à fórmula que tanto êxito obteve nos hoje chamados clássicos dos anos 70. No domínio desse tipo de filmes, a década de setenta foi sem dúvida um tempo de transformação. Esgotados e transfigurados alguns dos grandes mitos do passado (Drácula, Frankenstein, The Wolf Man...), nova galeria de inquietantes personagens se lhes veio acrescentar. Muitas delas nada trouxeram de novo, mas houve alguns filmes conotados como de série B que justificaram a descoberta do novo filão. Dois dos mais emblemáticos foram “The Last House on the Left” (1972), de Wes Craven e “The Texas Chainsaw Massacre”, de Tobe Hooper (1974), nos quais este “Haute Tension” vai directamente beber nítidas influências.
Raramente um filme correspondeu tão bem ao seu título – estamos efectivamente em presença de uma tensão muito alta, que se inicia pouco depois do prólogo e que só nos permite voltar a respirar normalmente mesmo no fim do filme. Marie (Cécile De France) vai com a sua amiga Alex (Maïwenn Le Besco) para a casa de campo da família desta última. O objectivo é aproveitaram a pacatez e o isolamento do local para porem os estudos em dia. Mas logo na primeira noite entra em cena um assasino psicopata que chacina brutalmente os pais, o irmão mais novo e o cão de Alex, abandonando a casa com esta última como prisioneira na caixa da sua furgoneta. Marie, que durante toda a carnificina se consegue furtar à atenção do assassino, introduz-se na furgoneta a tempo de acompanhar a amiga e tentar desse modo livrá-la de uma morte anunciada.
A grande força de “Haute Tension” é portanto a capacidade de reavivar imagens e sensações há muito esquecidas pelos apreciadores do género. Com um ritmo avassalador que não perde tempo a parodiar o que quer que seja (infelizmente uma das características mais comuns dos filmes actuais do género), Alexandre Aja presta uma homenagem ao cinema que provavelmente o aterrorizou enquanto jovem. De realçar o trabalho de Cécile de France – uma das novas coqueluches do cinema francês – na composição da personagem à volta da qual todo o filme se constrói, conferindo-lhe um grande vigor e sensualidade. É justamente nesse erotismo perturbador que “Haute Tension” joga os seus melhores trunfos, ao utilizar o sangue como elemento sexual, revelador último do carácter da jovem virgem.
Tecnicamente irrepreensível, com uma fotografia exuberante e uma banda-sonora apropriada (é de destacar aqui o êxito italiano dos Ricchi e Poveri, “Sarà Perché Ti Amo” e o tema “A Toutes Les Filles Que J’ai Aimé Avant”, de Felx Gray e Didier Barbelivian, ambos usados com certos propósitos), é no argumento ou, mais precisamente, nos últimos dez minutos, que “Haute Tension” desilude. Com efeito, a reviravolta introduzida, aquele twist final, deixa muito a desejar. Nem todos os filmes se prestam a “enganar” o espectador, tal como “The Sixth Sense” de Night Shyamalan o fazia exemplarmente.
Neste caso julgo que ninguém embarcará de ânimo leve na “revelação-surpresa”, nem mesmo após uma segunda e atenta visão do filme – as pontas soltas são em demasia para que até o mais crédulo possa ser convencido. Uma única excepção, a cena da masturbação, ocorrida imediatamente antes da chegada do assassino à casa, adquire novo significado quando nos encontramos já munidos desse conhecimento adicional. Mas apesar de tudo, este “fim de festa” decepcionante não consegue fazer esquecer tudo o que de bom e excitante “Haute Tension” contém, e que rapidamente o tornou conhecido e referenciado pelos amantes do slasher-movie.