domingo, setembro 19, 2010

IL BUONO, IL BRUTTO, IL CATTIVO (1966)

O BOM, O MAU E O VILÃO




Um filme de SERGIO LEONE


Com Clint Eastwood, Eli Wallach, Lee Van Cleef, Aldo Giuffrè, Luigi Pistilli, Rada Rassimov


ITÁLIA / 175 min / COR / 16X9 (2.35:1)


Estreia em Itália a 23/12/1966


«Nunca teria filmado “Aconteceu no Oeste”, nem mesmo “O Bom, o Mau e o Vilão”, se John Ford não me tivesse feito descobrir o deserto do Arizona e as suas vilas de madeira banhadas por uma luz admiravelmente intensa, quando eu era uma criança. A sua América era um país utópico, mas era uma utopia irlandesa, isto é, profundamente católica, repleta de piedade e de camaradagem, dotada de humor, mas desprovida de ironia e, sobretudo, de crueldade. A minha visão da América é muito diferente da sua e, nos meus filmes, sempre considerei o lado mau do dólar, o lado obscuro»
«Desde o início quis falar da Guerra da Secessão. Queria descrever a imbecibilidade humana num filme picaresco, onde mostraria também a realidade da guerra. A verdadeira história dos Estados Unidos foi construída com uma violência que a literatura e o cinema nunca mostraram. E eu desconfio sempre da História oficial. É, sem dúvida, por ter nascido num regime fascista. Vi como se manipulava a verdade da História» (Sergio Leone)
Blondie: "You see, in this world there's two kinds of people, my friend: Those with loaded guns and those who dig. You dig"

Na arena implantada no centro de um cemitério, Clint Eastwood, Lee Van Cleef e Eli Wallach afastam-se lentamente para a periferia do círculo. É o início do trielo final de “Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo”, o momento crucial das grandes decisões, o apogeu do estilo de Leone. Progressivamente a câmara vai-nos dando planos dos três homens enquanto a música de Morricone confere às imagens um sentido coreográfico. Os sucessivos close-ups vão perscutando tudo, até aos mais ínfimos pormenores: o levantar de uma sobrancelha, o piscar de um olho, o retrair de um dedo, a passagem de uma língua por uns lábios secos. A teatralização da realização passa por uma descrição feitichista das posturas e um alongamento temporal da situação até ao seu rápido desenlace.
Sergio Leone, para infelicidade de todos os seus fans, apenas assinou a realização de 7 filmes na sua meteórica carreira. Mas esses sete magníficos ficarão para sempre com um lugar cativo na história do Cinema. Este “Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo” é o quarto, o do meio da balança, e o capítulo final daquela que ficou conhecida como a trilogia dos dólares (“Per Un Pugno Di Dollari / Por Um Punhado de Dólares” em 1964 e “Per Qualche Dollari in Più / Por Mais Alguns Dólares” em 1965, foram os dois primeiros). O êxito europeu desses primeiros filmes desperta o interesse de Hollywood e a United Artists resolve financiar Leone com um orçamento de mais de um milhão de dólares, antecipando já a estreia conjunta dos três filmes nos Estados Unidos (o que viria a acontecer entre Fevereiro de 67 e Janeiro de 68). Muito ao estilo americano o herói dos três filmes é baptizado de “The Man With No Name” (certamente por causa da campa sem nome no final do último filme), mas sobretudo é o nome de Clint Eastwood que é projectado para o estrelato. Foi o primeiro personagem que no imaginário colectivo se tornou sinónimo do actor norte-americano. O segundo viria alguns anos depois, em 1971, quando Don Siegel deu vida pela primeira vez ao inspector Harry Callahan.  
Muito provavelmente pelo desafogo económico que Hollywood lhe concedeu Leone, para além de se preocupar em manter a continuidade do estilo patenteado nos dois filmes anteriores, tenta inovar e aperfeiçoar esse mesmo estilo. A ambição é agora muito maior e ganha forma no cruzamento entre duas histórias (a dos três protagonistas e a da Guerra da Secessão) que, aos poucos, se irão unir, antes de se fundirem na sequência final do cemitério. Ao fim e ao cabo é a própria Guerra da Secessão que Leone utiliza para aprimorar as suas personagens, ao mesmo tempo que denuncia o cinismo absurdo dos senhores da guerra que, de olhos cravados em cartas militares, enviam milhares de homens para a frente de batalha
Leone mantém com a guerra uma relação contrária à que tem com o western. Glorifica os personagens deste seu género predilecto mas desmistifica o heroísmo guerreiro. O capitão nortista (Aldo Giuffrè), responsável por manter uma posição inútil explica a Tuco e a Blondie o que deve fazer um bom estratega, mostrando por que motivo a garrafa de whisky é a melhor arma do soldado.
Desde muito cedo que o cemitério de Sad Hill se equaciona como o final da jornada para os três homens. Mas entre o momento em que descobrimos que o espólio está lá enterrado e o momento em que, finalmente, lá chegamos, o significado do cemitério foi alterado no nosso pensamento. O filme encarregou-se de nos lembrar que, num cemitério, há mais cadáveres de soldados mortos do que tesouros enterrados. «A ideia de arena era central», explica Leone: «uma ideia mórbida já que eram os mortos que viam o espectáculo. Fiz mesmo questão de que a música fizesse lembrar o riso dos cadáveres, no interior dos túmulos»
E Leone conclui: «Mesmo antes da sequência da arena imaginei a cena onde Clint encontra o poncho perto do jovem sulista em agonia. E fiz com que o vestisse. É o mesmo poncho que traz nos dois primeiros filmes. Posteriormente, quando liberta Tuco, afasta-se com este poncho. Vai ao encontro das aventuras anteriores. Vai para o Sul, para viver as histórias dos outros filmes. E o círculo fecha-se. A trilogia funciona num círculo fechado»

Ouçamos ainda Leone sobre a utilização da música de Morricone em “Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo”: «A música tinha uma importância permanente nesse filme. Podia ser o próprio elemento de uma acção. É o caso da sequência do campo de concentração. Uma orquestra de prisioneiros que tem de tocar para abafar os gritos dos torturados. Por vezes tinha de acompanhar as quebras de ritmo, como a chegada da carroça-fantasma, no deserto. Também desejava que a música raiasse o barroco, que não se limitasse à repetição entrecruzada do tema de cada personagem. Por vezes fazia tocar a música no local das filmagens. Isso criava a atmosfera da cena, influenciando a representação dos actores. Clint Eastwood gostava muito deste método.»
Uma vez mais os génios de Leone e Morricone se misturaram, ao ponto de não conseguirmos dizer onde acaba a música e começa o filme e vice-versa. O tema principal evoca de imediato o nome do filme, mesmo a quem nunca o tenha visto. A cena em que Tuco corre à volta do cemitério ao som de “Ecstacy of Gold” é pura poesia. E o duelo final, a seis mãos, é orquestrado de modo sublime.
É com “Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo” e “C’era Una Volta Il West”, realizado dois anos depois, que a reputação de Leone atravessa todas as fronteiras, afirmando-o como uma lenda cinematográfica. Nestas duas obras reescrevem-se as regras do western, a sua mitologia e todos os seus códigos são reavaliados. E ao mesmo tempo reconciliam o grande público com o cinema de autor. Lembre-se a propósito o que escreveu o jornalista Baptista-Bastos: «A grande aventura cultural de Sergio Leone não surge, isoladamente, da perspectiva histórica: nela se insere e fortalece. Não há “cinema-esparguete”, como não há “cinema-sardinha assada”. Há expressões culturais que se definem pela sua grandeza, pela sua audácia e pelo impulso que dão a outras relações humanas, portanto política, portanto sociais. Leone pertence a essa história. À nossa história»
 CURIOSIDADES:


- O filme foi rodado em Itália e Espanha e tirando os actores principais ninguém mais falava inglês, os restantes intervenientes expremiam-se nas línguas de origem (italiano ou espanhol), tendo por isso mesmo sido todos dobrados para a versão inglesa.


- O poncho que Clint Eastwood usa nos três filmes é o mesmo, nunca tendo sido limpo

- Toda a sequência da escolha da arma por Tuco é completamente improvisada. Por não perceber nada de armas Eli Wallach foi autorizado a fazer o que muito bem entendesse

- A versão original italiana (cerca de 175 minutos), estreada em 23 de Dezembro de 1966, foi reduzida em cerca de 14 minutos quando o filme foi exportado para o estrangeiro, em virtude de não terem sido dobrados em inglês. Esses 14 minutos apareceram como “extra” na primeira edição em DVD do filme.
Só recentemente, em 2003, é que a versão original foi totalmente restaurada em inglês por Martin Scorsese, Clint Eastwood e Alberto Grimaldi, tendo sido apresentada nos cinemas australianos e incluída na nova edição-dupla em DVD (2004). Essa restauração passou inclusivé pela adição de novos diálogos em inglês, feitos por Clint Eastwood e Elli Wallach, além do som, que foi convertido para 5.1



Para os interessados junto se anexa a banda-sonora original:


3 comentários:

Rato disse...

Aqui fica a banda-sonora para os interessados:

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JMAbreu disse...

Muito obrigado por esta postagem, um classico do cinema, imperdível, e quase todos os filmes de Sergio Leone, tem o seu cunho pessoal na história do cinema.Sendo um outro filme dele um marco,"Once Upon a Time in America" um CULT.
JMAbreu

Rato disse...

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