Nascido a 2/8/1932, em Connemara,
Irlanda
Falecido a 14/12/2013, em Londres,
Inglaterra
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Todos nós, à
medida que envelhecemos, vamo-nos transformando noutras pessoas, sobretudo
através da imagem que os outros têm de nós. E chega mesmo uma altura em que
pouco ou nada resta daquilo que fomos outrora. Essa transformação pode ser
lenta e natural, apenas influenciada pelo avolumar dos anos ou pode ser rápida
e radical, em que agentes externos são determinantes. O homem que morreu no
passado sábado, com 81 anos, pertencia a esta última categoria. O álcool e a
doença foram-no minando pouco a pouco, e agora nada mais restava do que um
pequeno conjunto de traços fisionómicos, uma certa pose ou ainda um olhar ou
outro a lembrar-nos o passado. Mas, para quem se habituou a idolatrá-lo através
de muitas telas de muitos cinemas, esse homem foi um dia belo, elegante, olhos de
cristalino azul, voz simultaneamente macia e dramática, gestos longos e por
vezes excêntricos, uma figura quase aristocrática. E foi também um dos maiores
actores da sua geração, que fácil e naturalmente, entrou no panteão das lendas
imortais.
Peter Seamus O’Toole escreveu um dia no seu diário de juventude: «Não
serei um homem comum, porque é meu direito ser extraordinário.» Meu escrito,
meu feito. Depois de sair de uma escola de freiras ao 13 anos, tem vários empregos, sendo estafeta e assistente de fotografia, entre outras ocupações. Alista-se na Royal Navy, onde é animador
radiofónico durante 2 anos (período em que descobre o seu gosto pelo rugby e pelo críquete), e depois estabelece-se em Leeds para se dedicar ao comércio
e ao jornalismo. Graças a um amigo íntimo, o actor Wilfred Lawson, revela-se na
sua vocação teatral com apenas 17 anos de idade, e consegue uma bolsa de estudo para a Royal
Academy of Dramatic Arts, em Londres (onde é colega de Albert Finney, Alan
Bates e Richard Harris). Acaba o curso em 1955 e entra na Old Vic Company, em Bristol. Interpreta em
pouco mais de três anos e meio cerca de 80 obras clássicas e modernas, sendo
eleito o melhor actor dos palcos ingleses em 1959, ano da sua estreia no cinema
e da sua fugaz passagem pela TV inglesa. Posteriormente, realiza uma memorável
temporada no Shakespeare Theatre de Stratford-upon-Avon (terra natal do dramaturgo
inglês).
Nesses finais da
década de 50, Peter O'Toole, filho
de um corretor de apostas irlandês e de uma enfermeira escocesa, já tinha
deixado para trás a ambição de ser escritor (mais precisamente, poeta) que
tinha alimentado na sua juventude (chegou mesmo a editar alguns livros), para
se dedicar, de corpo e alma, àquilo que seria a sua verdadeira vocação: a arte
de representar, quer em cima dos palcos quer à frente das câmaras. E nessa arte
foi grande, grande entre os grandes. Essa grandeza chega em 1962, depois de
alguns anos a desempenhar papeis secundários em alguns filmes e séries
televisivas. E chega por culpa de dois outros grandes actores. O papel fora
inicialmente pensado para Marlon Brando, que não estava disponível, e oferecido
depois a Albert Finney, que o recusou. O filme, como se sabe, chamou-se “Lawrence da Arábia”, e foi realizado
pelo inglês David Lean que o viria a imortalizar. A personagem colar-se-ia a O’Toole para sempre, apesar do actor
não vir a ganhar o Óscar (a primeira de uma série de oito nomeações nunca concretizadas) para o
qual seria indigitado. A estatueta dourada, nesse ano de 1963, iria para
Gregory Peck, pelo filme “To Kill A Mockingbird”. Pelo seu lendário desempenho
da personagem de T.E. Lawrence, O’Toole
ganharia contudo o BAFTA inglês e ainda o Globo de Ouro para o estreante mais promissor (teria também a sua primeira nomeação para o Globo de Ouro de melhor actor de drama). Muitos anos depois, em 2006, a
revista Premiere colocaria o desempenho de O’Toole
no cimo das 100 melhores interpretações de todos os tempos.
A década de
sessenta seria o apogeu da carreira de O’Toole,
com o actor a desdobrar-se em múltiplos papeis, todos eles notáveis, que fariam
dos seus filmes dessa época obras inesquecíveis. Quem não se lembra de “Becket” (1964), ao lado de Richard
Burton, “Lord Jim” (1965), baseado
na obra homónima de Joseph Conrad (para mim o seu segundo papel mais emblemático), "What's New, Pussycat?" (1965), com Woody Allen e Peter Sellers, “How To Steal A Million” (1966), uma
elegante comédia com Audrey Hepburn, “The
Night Of The Generals” (1967), ao lado, uma vez mais, do seu amigo Omar
Sharif, o histórico “The Lion In Winter”
(1968), onde interpreta pela 2ª vez o Rei Henrique II, ou o divertido musical “Goodbye Mr. Chips” (1969), ao lado de Petula Clark? Já na década
de setenta, a sua carreira começou a furar as expectativas anteriormente
forjadas. Os bons papeis ficavam-se cada vez mais pela sombra e, por outro
lado, o actor começava a deixar-se afectar pela dependência do álcool, o que
lhe ocasionou uma reputação de boémio e conflituoso. O seu casamento com a
actriz Siân Phillips, que duraria de 1959 a 1979 e que lhe traria dois filhos, foi marcado nos últimos anos
por uma relação tempestuosa, na qual os ciúmes e os acessos de alcoolismo
foram preponderantes.
Num livro chamado
“Hellraisers”, Robert Sellers, o seu autor, relata alguns desses episódios,
como por exemplo, certo dia O’Toole
começar a beber em Londres e acordar no dia seguinte em Marselha, no sul de
França, sem saber como lá tinha ido parar. «Eu, o Richard Burton e o Richard
Harris, fazíamos em público o que os outros só faziam em privado na altura.
Bebíamos e fumávamos erva», afirmou ele numa entrevista ao jornal “The
Guardian”, confessando ainda nunca se ter arrependido de nada na sua vida, «nem de uma única gota». Mas
os excessos produziram os seus estragos. No final da década, O’Toole submeter-se-ia a diversas
operações, tendo-lhe sido retirados o pâncreas e parte do estômago, em 1976.
Dois anos depois foi uma disfunção sanguínea que voltou a ameaçá-lo de morte.
Mas o actor daria a volta por cima, regressando à ribalta pouco tempo depois.
O cinema acabaria
por travar a carreira teatral de Peter O’Toole, que se tornou muito mais
esporádica, tendo o actor apenas regressado aos palcos na década de 80 – uma
encenação de “Macbeth” que dividiu a crítica, embora tenha sido um grande
sucesso junto do público. Em 1983 interpreta a personagem de Sherlock Holmes em
três filmes, e quatro anos depois recusa o título de cavaleiro, apesar de se
considerar um romântico incurável, estudioso e apreciador do sexo feminino (que
contudo nunca chegou a entender), conforme declarou numa entrevista concedida à
BBC, na qual afirmou também saber de cor todos os sonetos
de Shakespeare. Quando, em 23 de Março de 2003, a Academia de Hollywood lhe
concedeu um Óscar honorário (entregue por Meryl Streep), o agradecimento
público do actor pautar-se-ia pela ironia: «Always a bridesmaid, never a bride
my foot! (Sempre dama-de-honor, nunca uma noiva!)» Há pouco mais de um ano, em
10 de Julho de 2012, O’Toole
anunciou ir colocar um ponto final na sua carreira, alegando «já não ter gosto»
por ela: «A paixão deixou-me e já não vai voltar.» Nessa altura o actor
encontrava-se a escrever o terceiro volume das suas memórias, onde se pode ler
a frase: «Não fui um homem comum. Agitei a areia suave da monotonia.»
FILMOGRAFIA:
2014 – Katherine of Alexandria
2013 – The Whole World at Our Feet
2012 – For Greater Glory: The True Story of Cristiada
2010 – Eager To Die
2008 – Christmas Cottage
2008 – Dean Spanley
2007 – Stardust /
Stardust: O Mistério da Estrela Cadente
2006 – One Night with the King / Uma Noite com o Rei
2006 – Venus (nomeações para o Oscar, BAFTA e Globo de
Ouro)
2005 – Lassie
2004 – Troy / Tróia
2003 – Bright Young Things / Sexo, Escândalos e
Celebridade
2002 – The Final Curtain
2002 – Global Heresy
1999 – Molokai: The Story of Father Damien
1999 – The Manor
1998 – Phantoms / Fantasmas
1997 – FairyTale: A True Story
1993 – The Seventh Coin / A Sétima Moeda
1992 – Rebecca’s Daughters
1991 – Isabelle Eberhardt
1991 – King Ralph / King Ralph: O Primeiro Rei
Americano
1990 – The Rainbow Thief
1990 – Wings of Fame
1989 – In Una
Notte di Chiaro di Luna / Morte Silenciosa
1988 – High
Spirits / Malucos e Libertinos
1987 – The Last
Emperor / O Último Imperador (nomeação para o BAFTA)
1986 – Club
Paradise / Clube Paraíso
1985 – Creator /
Louca Por Si, Professor
1984 – Supergirl
1983 – Sherlock Holmes and a Study in Scarlet
1983 – Sherlock Holmes and the Sign of Four
1983 – Sherlock Holmes and the Valley of Fear
1982 – My
Favorite Year / O Meu Ano Favorito (nomeações para o Oscar e Globo de Ouro)
1980 – The Stunt
Man / O Fugitivo (nomeação
para o Oscar)
1979 – Caligula /
Calígula
1979 – Zulu Dawn
/ Alvorada Zulu
1978 – Power Play
/ Golpe de Estado
1976 – Foxtrot
1975 – Man Friday
/ O Meu Criado Sexta-Feira
1974 – Rosebud / O Caso Rosebud
1972 – The Ruling
Class / A Classe Dominante (nomeação para o
Oscar)
1972 – Man of La
Mancha / O Homem da Mancha
(nomeação para o Globo de Ouro de actor de drama)
(nomeação para o Globo de Ouro de actor de drama)
1971 – Under Milk Wood
1971 – Murphy’s
War / Duelo à Beira do Rio
1970 – Brotherly Love or Country Dance / Jogo na Escuridão
1969 – Goodbye,
Mr. Chips / Adeus, Mr. Chips
(nomeação para o Oscar e vencedor do Globo de Ouro para actor de drama)
(nomeação para o Oscar e vencedor do Globo de Ouro para actor de drama)
1968 – The Lion
in Winter / O Leão no Inverno
(nomeação para o Oscar e vencedor do Globo de Ouro para actor de drama)
(nomeação para o Oscar e vencedor do Globo de Ouro para actor de drama)
1968 – The Great Catherine / Catarina, Imperatriz da Rússia
1967 – The Night of the Generals / A Noite dos
Generais
1966 – The Bible / A Bíblia
1966 – How to Steal a Million and Live Happy / Como Roubar Um Milhão
1965 – What’s New
Pussycat? / O Que Há de Novo, Gatinha?
1965 – Lord Jim
1964 – Becket (nomeações para o Oscar e BAFTA;
vencedor do Globo de Ouro para actor de drama)
1962 – Lawrence
of Arabia / Lawrence da Arábia (nomeações para o Oscar e Globo de Ouro de actor de drama; vencedor do BAFTA e
do Globo de Ouro para o estreante mais promissor)
1960 – The Day They Robbed the Bank of England / O Roubo do Banco de Inglaterra
1960 – The Savage Innocents / Sombras Brancas
1959 – Kidnapped / Raptados
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