Não tentem desmentir-me, nem me venham com paleio de coincidências. Se é a 1 de Junho que se comemora o Dia da Criança, é por ser, digo eu, o dia em que nasceu Marilyn Monroe, a criança mais criança que o mundo já conheceu. Marilyn, sendo menina, era uma Capuchinho Vermelho a fingir que o Lobo Mau não era só lobo, nem era só mau, como se vê pela mágoa quase nostálgica desta confissão: «Nunca ninguém me disse que eu era bonita quando era criança. Todas as meninas precisam que lhes digam que são bonitas, mesmo quando não são.» Estava a reunir notas para esta crónica e a pensar muito nela – mesmo muito – e descubro o que já todos os meus leitores sabem, que o segredo de Marilyn está na forma como caminha. Não; ela não caminhava como toda a gente, ela não punha bem uma perna à frente da outra. Dou-lhe a palavra: «Aprendi a andar em bebé e não me voltaram a dar lições desde essa altura.»
É
esse andar precário, pueril e periclitante que vemos em “Monkey Business”, “Gentlemen
Prefer Blondes”, “Seven Year Itch” e “Some Like It Hot”. É um susto ver Marilyn caminhar – vai cair, ai, vai
cair! Que medo que temos de que ela se magoe ou lhe aconteça uma coisinha má.
No cinema, e principalmente nas comédias, é mesmo isso que em geral queremos.
Queremos que os actores caiam. Chaplin cai e mesmo se John Wayne tropeça, o
espectador ri-se. Nos filmes de Marilyn
só nos rimos, felizes, quando e porque ela não cai. Billy Wilder, para mim o
cineasta que melhor a entendeu, tira-nos da boca as palavras de protecção, mimo
e consolo que nos apeteceria sussurrar a esta mulher crescida, a quem ninguém
foi capaz de dizer «és bonita» quando era pequenina.
Diz
Wilder: «Está assustada e insegura de si mesma. Chego a ter
vontade de ser psicanalista e que Marilyn seja minha paciente. Até podia dar-se
o caso de não a conseguir ajudar, mas que linda que ela ficaria deitada no
divã.» Só o candor
deste austríaco é que, sem ponta de vulgaridade, seria capaz de expressar, com
tamanha gentileza, a enternecida vontade de querer fazer tanto bem a outra
pessoa. E tanta filantropia porquê? Por ela ser criança, claro, e ter nascido
no dia em que mais queremos que as crianças o sejam. Clark Gable, que usava
bigode e era bruto como as casas, também não escapou a essa onda de comovido
bambinismo, e faz questão de vir aqui pôr uma pedra no assunto: «Tudo
o que ela faz é diferente, estranho e excitante, desde o modo como fala à
maneira como usa aquele torso glorioso. Ela consegue que um homem sinta orgulho
de ser homem.» Marilyn caminha, o seu glorioso torso
dobra uma esquina e todo o homem que sinta orgulho de ser homem quer logo ser
uma esquina.
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