sexta-feira, junho 08, 2012

RENO - A Maior Cidadezinha do Mundo

It’s a long, long way down to Reno, Nevada…
(Richard Fariña)

Quando se fala em Reno vêm-nos sempre à memória duas coisas: jogo e divórcios. Jogo porque Reno é, nos dias de hoje, um parente pobre de Las Vegas, não obstante ter sido até aos anos 50 a grande capital do jogo nos Estados Unidos. E ainda hoje mantém em museu a primeira “slot machine” vista em terras do Tio Sam. Divórcios devido a uma Lei que existe no Estado de Nevada que permite a alguém que por lá estabeleça residência durante um curto espaço de tempo se possa divorciar com relativa facilidade. A História do Cinema está cheia de cenas destas, e a mais célebre delas todas poderá muito bem ser “The Misfits”, que Arthur Miller escreveu para proporcionar um papel “sério” à sua mulher e que John Huston realizou em 1961. Se bem se lembram, o pretexto para o arranque do filme é o divórcio de Roslyn (certamente que, na cabeça de Miller, um misto de “rose” e Marilyn…), personagem interpretado pela Marilyn Monroe.

A determinada altura do filme a simpática personagem de Thelma Ritter, ela própria também divorciada, faz uma saúde ao Estado de Nevada e dá-lhe uma bela definição, síntese do que atrás vos disse:
- Ao Nevada, o Estado do deixa cá!
- O estado do quê…?
- Do deixa cá…! Tens dinheiro para jogar, deixa-o cá. Uma mulher de quem te queres ver livre, é aqui. Bombas atómicas de que não precisas, fá-las explodir aqui, ninguém se chateia. O slogan do Nevada é “anything goes”, mas depois não te queixes…
Parece que, como talismã para não se voltarem a divorciar, é tradição entre as senhoras atirarem as suas velhas alianças ao rio Truckee, na ponte que aqui vemos na fotografia, e por isso se comenta no filme que esse rio deve ter mais ouro do que todo o Klondike…!



Mas para mim, que não sou muito de jogar em casinos e não me vim divorciar (vantagens de ter contrato a termo incerto…!), Reno reservou-me uma excelente surpresa: o “National Automobile Museum”, um magnífico acervo de mais de duzentas viaturas antigas resultante da colecção privada de Billy Harrah, proprietário da rede de casinos Harrah’s. Encontramos lá de tudo, tanto viaturas de passageiros como carros de competição. E lá estão, como poderão ver, o Mercury de 1949 que James Dean guiava no “Rebel Without a Cause”, um Corvette 1953 que foi de John Wayne (tenho um igualzinho …. à escala 1.18!) e também exemplares de carros do Elvis, do Sinatra e muitos outros mais. Mas aquele a que acho mais graça é o Airmobile com rabo de peixe, de 1937. Não é de admirar que não tenha tido grande sucesso comercial…!

Mas ao contrário de Las Vegas, onde nos sentimos sempre em absoluta segurança, Reno impõe um certo respeito. Tirando a avenida principal dos Casinos, aquelas enormes ruas são desertas e mal iluminadas, vendo-se apenas, pelas esquinas, alguns grupinhos de ar suspeito que nos dão vontade de acelerar o passo a caminho do hotel. A pobre da Cristina já tremia de medo e eu tive o bom senso de não lhe contar o que dizia o Johnny Cash no seu “Folson Prison Blues”:

«When I was just a baby, my mother told me
Son always be o good boy, don’t ever play with guns
But I shot a man in Reno, just to watch him die…!»


Não foi, assim, com grande tristeza que deixámos Reno, que se auto proclama “The Biggest Little City in the World”. Quando saímos não era de noite nem se viam as estrelas, mas não consegui deixar de me lembrar das últimas palavras do “Misfits”, quando a Marilyn, cabeça encostada ao ombro do Clark Gable, lhe pergunta «Como é que se encontra o caminho no escuro?», e este lhe responde: «Seguimos na direcção daquela grande estrela. A auto-estrada fica mesmo por baixo. Ela levar-nos-á até casa…»



Num filme desesperado e carregado de personagens à deriva, dentro e fora da tela, Arthur Miller quis deixar uma réstia de esperança. Mas foram as últimas frases de ambos no Cinema…
(Luís Miguel Mira, "Crónicas da América", Editora Fonte da Palavra, Março 2010)

2 comentários:

Anónimo disse...

Ei, eu moro perto de San Francisco e me casei em Reno, há quase 20 anos atrás. Inclusive temos um foto perto daquela ponte, na beira do rio. E em todos esses anos nunca pensamos em divórcio. :)

Nuno disse...

Este texto dá vontade de visitar... os filmes.