segunda-feira, setembro 23, 2013

BIO-FILMO: ROMY SCHNEIDER

(Rosemarie Magdelena Albach-Retty)
Nascida em Viena, Áustria, a 23 de Setembro de 1938
Falecida em Paris, França, a 29 de Maio de 1982
«I am nothing in life, but everything on the screen»

Falar de Romy Schneider, passados pouco mais de vinte anos sobre o seu desaparecimento, em Maio de 1982, é recordar paralelamente os anos de ouro da minha juventude, quando os filmes, as actrizes e os actores nos marcavam de uma forma profunda e povoavam o nosso imaginário.


A televisão ainda não tinha chegado a todas as casas portuguesas, daí o culto pelo cinema começar bem cedo nos adolescentes e quase adultos. Havia os óptimos Cine Clubes por todo o lado, revistas de cinema de diversos géneros e nas praias de veraneio os bilhetes eram tão baratos que dava para ir ao cinema todos os dias. Víamos praticamente tudo, e nos nossos 18 anos sonhávamos com Grace Kelly, Catherine Deneuve, Ornela Mutti, Claudia Cardinale, Shirley MacLaine ou a doce de olhos dourados Marie Laforêt. As que tinham mais seguidoras eram Audrey Hepburn e Romy Schneider. Havia ainda outras actrizes que faziam “grandes estragos” entre a rapaziada como Brigitte Bardot, Virna Lisi, Jane Fonda, Sofia Loren e Gina Lolobrigida, mas essas tinham a ver com as medidas do busto. Foram, quanto a mim, os anos gloriosos do cinema europeu.


A primeira vez que Romy Schneider chegou aos nossos ecrãs, foi no papel de jovem imperatriz Isabel de Áustria, mais conhecida por Sissi da Baviera (1837-1898). História romantizada de uma princesa de 17 anos (a idade de Romy) que casou com o imperador da Áustria, Francisco José e que poderia ter sido um conto de fadas mas que redundou num casamento fracassado. O imperador amava Sissi, mas, desde os primeiros tempos de casados, que o protocolo da corte austríaca pesou demasiado sobre uma personalidade rebelde e ávida de liberdade como a de Isabel da Baviera. A pouco e pouco Sissi transformou-se numa mulher caprichosa e desadaptada a viver numa prisão dourada.

Romy Schneider foi uma maravilhosa Sissi no cinema, em cinco filmes de enorme sucesso e teve alguma dificuldade em se separar dessa imagem, mas como tinha verdadeiro talento acabou por se impor como actriz universal. Quando foi convidada, em 1958, para fazer o filme “Christine” com Alain Delon, a mãe, já uma reputada actriz, acompanhou-a a Paris, vigiando-a de perto. Como Romy não sabia francês, nem inglês, os primeiros tempos da rodagem não foram nada fáceis e sabe-se que o amor entre Romy e Delon só surgiu já as filmagens iam adiantadas e quando puderam finalmente ficar sós numa viagem que fizeram a Bruxelas para participarem no Baile do Cinema. Aí sim, descobriram uma fortíssima atracção e Romy, num acto de independência, decidiu passar a viver em Paris, enquanto a mãe se viu forçada a regressar a Colónia, com o padrasto, percebendo que tinha “perdido” a filha. Romy Schneider tinha 20 anos e Alain Delon 23 e durante muito tempo os fotógrafos não os deixaram em paz. Nesse período de euforia amorosa, os “namorados eternos” chegaram, em Março de 1959, a declarar oficialmente que estavam noivos. Mas jamais se casariam.


Sob a direcção de Luchino Visconti, uma obra de John Ford com Romy e Delon foi adaptada ao teatro, em Paris, na primavera de 1961: “Domage Qu’elle Soit une Putain”. Mais um desafio para Romy, que teve de dominar o francês. A peça foi um razoável sucesso, tendo estado oito meses em cartaz. A partir de então Romy passou a ser encarada como uma verdadeira actriz e não faltaram convites para filmar. A ex-Sissi fez questão de mostrar ao mundo que era muito mais que uma mulher deslumbrante, de uma beleza delicada, com uns olhos entre o verde e o azul num rosto perfeito, uma voz doce e um corpo de Afrodite. Podemos ver a sua beleza plena em fotos de vários fotógrafos, especialmente na série produzida pela fotógrafa britânica Eva Sereny em que posou nua, sem quaisquer inibições. Nesses princípios dos anos 60 Romy já tinha na sua carreira cerca de vinte filmes, pois iniciara a carreira aos 15 anos, num filme ao lado da mãe. Embora austríaca filmou também na Alemanha, em início de carreira.


Paris sorria-lhe. A grande dama da moda, Coco Chanel adorava ver Romy vestida com os seus tailleurs e colares de pérolas e ficaram amigas. Usava-se o risco negro nos olhos, rímel, os lábios com baton vermelho e Romy aparecia sempre deslumbrante pois caprichava nas toilettes. Era elegantíssima, dentro e fora da tela. Em 1962 Romy filmou “O Processo”, de Kafka com Orson Welles. A actriz contava que lhe chegavam às mãos centenas de guiões e que sempre os lia atentamente para apenas filmar bons argumentos com bons realizadores. Em 1963 foi a vez de Otto Preminger que consolidou a sua carreira de grande actriz internacional no filme “O Cardeal”. Foi dirigida por os mais prestigiados realizadores, como Claude Sautet, Claude Chabrol, Joseph Losey, Costa-Gavras, Andrzej Zulawski e tantos outros. E os actores, com quem contracenou, eram, sem dúvida “a nata” do cinema mundial: Jack Lemmon, Anthony Quinn, Jean-Claude Brialy, Jean-Louis Trintignant, Peter O’Toole, Michel Piccoli, Anthony Perkins, Harvey Keitel, Hugo Tognazzi, Marcello Mastroianni, Yves Montand, Richard Burton, Silvana Mangano, Jane Birkin, Isabelle Huppert, Jeanne Moreau.
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O seu filme de maior sucesso (que não o melhor) foi, em 1969, “A Piscina”. Nessa altura os eternos namorados, Romy Schneider e Alain Delon já tinham acabado a sua tórrida relação de cinco anos (entre 1958-1963) mas Romy não deixou de mostrar o seu profissionalismo, embora os media especulassem que o filme os podia fazer de novo cair nos braços um do outro. Mas tal não aconteceu. Delon diria mais tarde que, foi a partir deste filme que ficaram amigos para sempre! Talvez, mas Romy Schneider sofreu imenso quando Alain Delon a trocou de forma deselegante, por uma tal Nathalie Barthelemy. Romy filmava em Hollywood, e Delon em Madrid rodava “A Túlipa Negra” e deixava-se fotografar com Nathalie com quem viria a casar. Um pouco por despeito, Romy casou em 1966 com o realizador Harry Mayen. Do casamento nasceu David, esse filho adorado que a viria a marcar, até ao fim, a sua vida. Quando se divorciaram, em 1975, o marido exigiu-lhe metade da fortuna para que ela pudesse ficar com o filho e a actriz tudo deu por aquele filho que era a sua razão de viver. Quatro anos mais tarde esse desclassificado marido enforcou-se.


A vida, apesar de tudo, continuava a sorrir à bela Romy. De um segundo casamento com o seu secretário, Daniel Biasini, que durou entre Dezembro de 75 e Junho de 81, teve a filha Sara, em 1977. Mas Biasini não terá sido o companheiro ideal para uma Romy bastante fragilizada no domínio dos amores. Sucesso só no cinema, pois foi distinguida com dois Césares (os Óscares franceses) em 1976 e 1979, como melhor actriz nos filmes “Une histoire simple” e “L’Important c’est d’aimer”. Seria nomeada por mais três vezes, pelos filmes “Une Femme à Sa Fenêtre”, “Clair de Femme” e “La Passante de Sans-Souci”, o seu derradeiro filme. Na vida privada Romy sofria depressões e sabe-se que se refugiava no álcool e comprimidos e que parava para fazer curas de desintoxicação. Apenas o cinema e os filhos lhe davam sentido à vida.


Por fim a tragédia. Como na vida da imperatriz Sissi, que viu o seu filho Rodolfo suicidar-se com a amante do momento (hoje sabe-se que foram assassinados), também Romy passou pelo transe de ver o filho David morrer de forma trágica, espetado nas lanças do gradeamento que protegia a casa da actriz. Estava-se em 1981 e David tinha apenas 14 anos. Romy Schneider não mais se recompôs dessa dor insuportável. Tinha a filha Sara, ainda muito pequena e resolveu comprar uma propriedade e ir viver para o campo. Já separada de Biasini e com um novo companheiro, passou a viver em Boissy-Sans-Avoir e numa manhã triste de Maio de 1982 encontraram Romy morta. Correram rumores na altura que a actriz se tinha suicidado, mas o óbito foi declarado oficialmente como devido a uma paragem cardíaca. Tinha 43 anos. O mundo ficou consternado com a sua morte. A França que sempre considerou Romy Scnheider como “sua”, fez a emissão, em 1995, de uma moeda de ouro de cem francos com o seu rosto.


Para culminar, em Dezembro de 1999, a Fígaro Magazine fez um grande inquérito sobre as dez mais belas mulheres do século XX e Romy Schneider ficou em primeiro lugar, logo seguida de Ava Gardner. Nesse mesmo ano Pedro Almodóvar dedicar-lhe-ia o filme “Todo Sobre Mi Madre”. Em 2008 ser-lhe-ia atribuído um César Especial (o apresentador do prémio foi Alain Delon). Embora as gerações mais novas a não conheçam, um dia, quem sabe, um qualquer canal de televisão reporá os seus melhores filmes e provavelmente será moda imitar Romy Schneider, como se copiam Elvis Presley, James Dean, Marylin, Diana de Gales... Os ídolos têm mortes trágicas!

(Maria Luísa Paiva Boléo in Revista Máxima, Setembro 2002)


FILMOGRAFIA:

1982 – La Passante du Sans-Souci / O Bar da Última Esperança
1981 – Garde à Vue / Sem Culpa Formada
1981 – Fantasma d’Amore / Fantasma de Amor
1980 – La Banquière / A Banqueira
1980 – La Mort en Direct / A Morte em Directo
1979 – Clair de Femme / A Luz da Paixão
1979 – Bloodline / Laços de Sangue
1978 – Une Histoire Simple / Uma História Simples
1977 – Gruppenbild Mit Dame
1976 – Une Femme à Sa Fenêtre
1976 – Mado
1975 – Le Vieux Fusil
1975 – Les Innocents Aux Mains Sales / Os Inocentes de Mãos Sujas
1975 – L’Important C’est d’Aimer / O Importante é Amar
1974 – Le Trio Infernal / O Trio Infernal
1972 – Un Amour de Pluie / Um Amor Passageiro
1972 – The Assassination of Trotsky / O Assassinato de Trotsky
1972 – Ludwig / Luís da Baviera
1972 – Le Mouton Enragé / O Cordeiro Enfurecido
1972 – La Polpe d’Orquide
1972 – Le Train / O Último Comboio
1972 – César et Rosalie / César e Rosália
1971 – Max et les Ferrailleurs / O Estranho Caso do Inspector Max
1971 – Qui? / Quem?
1971 – La Califfa / A Califa
1970 – Bloomfield / A Queda de um Ídolo
1970 – My Lover My Son
1970 – Ciakmull: L’Uomo della Vendetta / O Homem da Vingança
1969 – Les Choses de la Vie / Coisas da Vida
1969 – La Piscine / A Piscina
1968 – Otley / Espião por Acidente
1967 – Battle of the River Neretva
1966 – La Voleuse / A Ladra
1966 – Triple Cross / O Maior Espião da História
1965 – 10:30 P.M. Summer
1965 – What’s New Pussycat? / Que Há de Novo Gatinha?
1964 – L’Amour à La Mer
1964 – Good Neighbor Sam / Empresta-me o Teu Marido
1964 – L’Enfer / O Inferno
1963 – The Victors / Os Vitoriosos
1963 – The Cardinal / O Cardeal
1962 – Le Combat dans l’Île / Duelo na Ilha
1962 – Forver My Love
1962 – Boccacio 70 / Boccacio 70 (episódio “Il Lavoro”)
1962 – The Trial / O Processo
1961 – Die Sendung der Lysistrata
1959 – Plein Soleil / À Luz do Sol
1959 – Katja / Katia
1959 – Die Schöne Lügnerin / A Bela Mentirosa
1959 – Ein Engel Auf Erden / Um Anjo de Rapariga
1959 – Die Halbzarte / Eva, ou Diário de Uma Rapariga
1958 – Christine / Cristina
1958 – Mädchen In Uniform / Raparigas de Uniforme
1958 – Scampolo / A Miúda
1957 – Sissi – Schicksalsjahre Einer Kaiserin / Sissi e o Destino
1957 – Robinson Soll Nicht Sterben / A Ilha Encantada de Robinson
1957 – Monpti / Monpti
1956 – Sissi – Die Junge Kaiserin / Sissi, a Jovem Imperatriz
1956 – Kitty Und Die Grobe Welt / Kitty e os Quatro Grandes
1955 – Sissi
1955 – Der Letzte Mann / O Último dos Homens
1955 – Die Deutschmeister / Parada Imperial
1954 – Mädchenjahre Einer Königin / Juventude de uma Rainha
1954 – Der Zigeunerbaron / O Barão Cigano
1954 – Feuerwerk / Fogo de Artifício
1953 – Wenn Der Weisse Flieder Wieder Blüht / Entre Dois Amores

3 comentários:

Anónimo disse...

De facto,já a caminho dos 64 anos achei reconfortante este artigo sobre uma das pessoas mais importantes no mundo do cinema: Romy Schneider. Sempre gostei muito dela, e acho que é um atentado ao bom gosto deixar esquecer esta mulher. Lembro-me como se fosse hoje da imensa tristeza que senti quando, em plena condução, ouvi pela rádio a triste notícia da sua morte. Fiquei verdadeiramente deprimido e ainda hoje tenho saudades dela.

Enaldo Soares disse...

Não sabia deste "O Processo" com R.Schneider. Vou querer vê-lo, com certeza.

ANTONIO NAHUD disse...

Grande atriz. A Romy da fase francesa, nos anos 70, se supera.

O Falcão Maltês