Um filme de JOHN
FRANKENHEIMER
Com Alan Bates, Dirk Bogarde, Georgia Brown, Hugh Griffith, Elizabeth Hartman, Ian Holm, David Warner, Carol White, etc.
GB / 132 min / COR /
16X9 (1.85:1)
Estreia nos EUA:
8/12/1968
Estreia em PORTUGAL:
19/10/1969
Estreia em
MOÇAMBIQUE: LM (cinema Infante), 20/2/1970
Yakov Bog: «A única coisa que o sofrimento me ensinou
é a inutilidade do sofrimento»
Alan
Bates (1934-2003) foi um dos meus actores de eleição dos anos 60 e 70. Era
daqueles que invariavelmente me fazia ir ao cinema, independentemente do filme
em cartaz, por ter sempre a garantia de uma boa representação. Fez filmes
inesquecíveis, que marcaram a história do cinema: “Alexis Zorbas / Zorba, o
Grego” (1964), “Far From The Madding Crowd / Longe da Multidão” (1967), “Women
In Love / Mulheres Apaixonadas” (1969), “The Go-Between / O Mensageiro” (1971),
“A Day In The Death Of Joe Egg / Um Dia na Morte de Joe Egg” (1972). Mas se
tivesse de eleger um único filme seu, seria precisamente este “Homem de Kiev”, um
filme que me perturbou bastante na primeira vez que o vi (tinha 16 anos nessa altura,
razão pela qual nunca mais me esqueci dessa forte experiência), e onde Alan Bates
tem um desempenho memorável. Coincidência ou não, foi este filme que lhe trouxe
a sua única nomeação para o Óscar de Hollywood. Perderia para Cliff Robertson,
em “Charly”, outra grande interpretação do ano, a par também de Peter O’Toole
em “The Lion In Winter / O Leão no Inverno”. Um trio de respeito, nessa 41ª
edição dos Óscars.
Dalton
Trumbo, um dos nomes da “lista negra” de Hollywood, escreveu o argumento,
baseado numa novela (Prémios Pullitzer e National Book, de 1967) de Bernard
Malamud, publicada em 1966, a qual, por sua vez, era baseada numa história
verídica, ocorrida nos primórdios do século XX na Rússia Czarista. Mais
concretamente em 1911, ano em que um oleiro judeu, Menahem Mendel Beillis, é
encarcerado por um crime que não cometeu, o assassínio de um menino cristão,
encontrado morto e mutilado nos arredores de Kiev. O caso causou indignação em
todo o mundo e fez com que os governantes russos arrepiassem caminho, soltando
o prisioneiro, após longos anos de martírio. No filme o personagem tem outro
nome, Yakov Bog, um camponês russo, judeu, que apenas
ambiciona ter uma vida sossegada, sem grandes problemas. Não quer saber de
engajamentos políticos (embora goste de ler Espinoza) nem muito menos de
atitudes belicistas contra os poderes instituídos. Para ganhar a vida, não se
importa de trabalhar para um anti-semita, Lebedev (Hugh Griffith), que uma
noite encontra na rua, completamente bêbado, ajudando a filha deste a levá-lo
para casa. A rapariga, chamada Zinalda (Elizabeth Hartman), é uma solteirona
experimentada, que tenta levar Bog para a cama. Quase consegue os seus
intentos, mas o facto de se encontrar menstruada inibe por completo o provável
parceiro, incapaz de praticar sexo nessas condições.
Curiosamente, pouco
tempo depois, Yakov Bog é confrontado de novo com o sangue, desta vez o
derramado no assassínio de uma criança, praticado através de um ritual
satânico, sendo acusado desse crime hediondo. A própria Zinalda, despeitada,
vem ajudar à festa, acusando-o
também, mas de tentativa de violação. A partir daqui, e até ao final, iremos
assistir à progressiva humilhação de Bog na prisão, sujeito a provocações
constantes e a torturas físicas e psicológicas, cada vez mais violentas, por
parte dos seus carcereiros, que teimosamente exigem uma confissão por um crime
não cometido. Bog tem apenas um aliado na sua trágica odisseia: o advogado
Bibikov (Dirk Bogarde), um aristocrata, que irá tentar amenizar as acusações.
Mas pouco tempo depois, é o próprio Bibikov que aparece enforcado numa
cela da prisão. O caso prolonga-se por vários anos, chegando ao conhecimento do
Conde Odoevsky (David Warner), ministro da Justiça, que resolve libertar Bog
por entretanto se ter descoberto o verdadeiro assassino, e também por causa de grandes
pressões internacionais. Mas Bog, num derradeiro alento para manter a pouca
dignidade que lhe resta, recusa ser perdoado por um crime que não cometeu,
exigindo um julgamento oficial. O filme termina com Bog a subir a longa
escadaria que leva ao tribunal, onde o veredicto final não poderá ser outro
senão a da imediata libertação. “The Fixer / O Homem de Kiev” é um filme
injustamente esquecido, que nunca teve uma edição decente em DVD. E é pena, por
se tratar de uma obra importante, que mantém toda a sua força e actualidade.
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