O MONTE DOS VENDAVAIS
Um filme de PETER KOMINSKY
Com Ralph Fiennes, Juliette Binoche, Janet McTeer, Sophie Ward, Simon Shepherd, Jeremy Northem, Jason Riddington, Simon Ward, etc.
GB/EUA / 105 min / COR / 16X9 (1.85:1)
Estreia no Reino-Unido a 16/10/1992
Estreia em PORTUGAL (Lisboa) a 24/6/1994
«Seja do que for que as nossas almas sejam feitas, a dele e a minha são iguais»
É usual ouvir-se dizer que a passagem para cinema de obras literárias nunca supera o original. Realmente isso acontece, mas nem sempre. Basta apontar alguns exemplos, como "Dr. Zhivago", "A Clockwork Orange", "The Bridges of Madison County" e muitos outros filmes conhecidos, para facilmente se perceber que o produto final fílmico supera em muito o livro adaptado. Mas o inverso também é verdadeiro, como acontece com o meu romance de eleição, "O Monte dos Vendavais" ("Wuthering Heights"). Único romance da novelista e poetisa Emily Brontë, o livro foi escrito entre Outubro de 1845 e Junho de 1846, tendo sido editado apenas na segunda metade de 1847, após o lançamento de “Jane Eyre”, da sua irmã, Charlotte Brontë. Ao contrário deste último, que se transformou logo de imediato num enorme sucesso, “Wuthering Heights” foi alvo de duras críticas, especialmente devidas à crueldade vinculada pela personagem de Heathcliff. Mas, ao longo dos anos (o tempo, esse eterno juiz, a impor uma vez mais o seu sábio veredicto), “Wuthering Heights” foi-se tornando extremamente popular, sendo alvo das mais variadas formas artísticas de adaptação: no cinema, na televisão e na rádio; um musical, um ballet, 3 óperas, uma canção de grande sucesso mundial (de Kate Bush, em 1978) e até um jogo de personagens.
Ler “O Monte dos Vendavais” é uma experiência inesquecível, uma viagem apaixonante ao mundo rural (condado de Yorkshire) da Inglaterra dos finais do século XVIII que serve de cenário à paixão, tão bela quanto trágica, entre Heathcliff e Cathy Earnshaw. Uma história de amor, obsessão e vingança, que contamina tudo em seu redor, por causa da sua força tempestuosa e quase demoníaca, mas que perdura para além da morte. A estação de televisão britânica UKTV Drama organizou recentemente um estudo sobre a popularidade da literatura inglesa. Numa lista de vinte títulos, escolhidos por cerca de dois mil leitores, “Wuthering Heights” foi considerada a maior história de amor de todos os tempos (com “Orgulho e Preconceito” de Jane Austen em segundo lugar; e, estranhamente, “Romeu e Julieta” de William Shakespeare em terceiro).
Emily Brontë (1818-1848) era uma personalidade fascinante. É o mínimo que se pode dizer de uma jovem mulher que, sem instrução formal e sem experiência de vida, conseguiu escrever um dos romances mais estudados da literatura inglesa. Viveu com as suas duas irmãs, Charlotte e Anne, que escreveram sob o apelido de Bell (Ellis no caso de Emily). Filhas de um pastor anglicano de origem irlandesa, Patrick Brontë, cresceram numa região desolada, num ambiente de perfeita união com a natureza. “Wuthering Heights” é a obra de uma jovem escritora (tinha 28 anos quando acabou de escrever o livro, vindo a falecer de tuberculose apenas dois anos depois, a 19 de Dezembro de 1848), de carácter solitário e sensível, que procurou no silêncio da natureza as correspondências vibrantes da sua imaginação. O resultado foi esta obra-prima da literatura mundial.
Mas concentremo-nos nas adaptações para o cinema – mais de uma dúzia – entre filmes, telefilmes e séries televisivas. De todas essas versões é de realçar a de 1939 (de William Wyler, com Merle Oberon e Sir Laurence Olivier nos protagonistas), a de 1954 (de Luis Buñuel, com Irasema Dilían e Jorge Mistral), a de 1970 (de Robert Fuest, com Anna Calder-Marshall e Timothy Dalton) e esta, de 1992.
Se o filme de Wyler é porventura o mais conhecido, e o de Buñuel o mais cinemático, a presente versão de Peter Kosminsky é aquela que mais se aproxima do romance original, e onde temos direito a uma portentosa interpretação de Ralph Fiennes, bem como à excelente música assinada por Ryuichi Sakamoto. É, de longe, a minha versão favorita, se bem que goste muito da intérprete inglesa (Anna Calder-Marshall) da versão de 1970 (onde se pode ver também um Timothy Dalton com apenas 26 anos, no seu segundo papel no cinema). Aqui chegado, apetece-me perguntar: que nível atingiria esta versão se a escolha tivesse recaído em Oliver Reed, o grande actor inglês, que por esta altura se encontrava no seu período de ouro? Julgo que não haveria ninguém mais indicado para interpretar a personagem apaixonada e violenta de Heathcliff. Oliver Reed tinha todos os predicados para nos ter podido brindar com uma interpretação histórica. Mas isso, infelizmente, não aconteceu. Por isso, a ideia com que se fica, sobretudo para os amantes do romance original, é que ainda está por fazer a versão definitiva de “Wuthering Heights” que consiga transpor para o grande ecrã toda a força do romance. Por isso, uma sugestão: vejam os filmes por mera curiosidade, mas, sobretudo, leiam o livro, porque será este que perdurará para sempre nas vossas memórias.