Um filme de GUILLEM MORALES
Com Belén Rueda, Lluís Homar, Pablo Derqui, Francesc Orella, Joan Dalmau, Julia Gutiérrez Caba
ESPANHA / 112 min / COR / 16X9 (2.35:1)
Estreia no CANADÁ a 11/9/2010
(Festival Internacional de Toronto)
Estreia em ESPANHA a 7/10/2010
(Festival Internacional de Stiges)
Estreia em PORTUGAL a 22/9/2011
¿Y si el universo se há apagado?
Do país de nuestros hermanos continuam a chegar coisas muito interessantes no domínio do cinema de horror. Esta produção de Guillermo Del Toro, mexicano nascido em Guadalajara, a 9/10/1964, e cujo nome podemos identificar com vários filmes, quer como realizador – “Mimic” [1997], “El Laberinto Del Fauno” [2006] – quer como produtor – “El Orfanato” [2007], “Biutiful” [2010] – ou mesmo argumentista – “Hellboy” [2004], “The Hobbit” [2012] – entre outros, dá aqui uma mãozinha a Guillem Morales (espanhol nascido em Barcelona, no ano de 1975) para a realização da sua segunda longa-metragem, após o ainda inédito em Portugal “El Habitante Incierto” [2004], intitulada “Los Ojos de Julia”, e protagonizada por Belén Rueda, a mesma actriz de “El Orfanato”, uma madrilena nascida a 16/3/1965, e cuja presença neste filme é uma das principais razões do seu interesse.
O grande mérito de “Los Ojos de Julia” é o não se deixar comprometer com as suas influências óbvias (Hitchcock e Argento, sobretudo), denotando, pelo contrário, uma forte aposta na originalidade e numa abordagem algo diferente da habitual. No observatório astronómico onde trabalha, Julia Levin tem o presságio de que algo aconteceu com a sua irmã gémea Sara, que vive numa localidade afastada e que padece do mesmo mal, uma doença degenerativa da vista que irá inevitavelmente conduzir ambas à cegueira. Dirige-se, com o marido, Isaac (Lluís Homar) a casa da irmã para descobrir que a mesma se enforcou na cave há já alguns meses (sequência que abre o filme). Mas Julia desconfia da aparente evidência e convence-se de que a irmã foi assassinada. O desenrolar dos acontecimentos dar-lhe-á razão e ela virá a ser eleita como alvo seguinte na lista do assassino. Não necessariamente como vítima a abater, mas isso ficará para ser descoberto pelo espectador numa primeira visão do filme.
A cegueira tem sido, ao longo dos anos, um tema que os chamados horror thrillers têm explorado, com maior ou menor sucesso. Desde os agora considerados clássicos - "Wait Until Dark" (Terence Young, 1967) com Audrey Hepburn ou "Blind Terror" (Richard Fleischer, 1971) com Mia Farrow - até aos mais recentes "Blink" (Michael Apted, 1994) com Madeleine Stowe ou "The Eye" (David Moreau e Xavier Palud, 2008) com Jessica Alba, este último aventurando-se mais no campo do sobrenatural. "Los Ojos de Julia" nada tem de irreal ou fantástico (embora por vezes pareça, mas isso deve-se à arte com que as sequências são filmadas e montadas, numa clara intenção persuasiva), antes envereda pelos caminhos do thriller psicológico, criando atmosferas sucessivas de angústia e inquietação, numa espiral sempre crescente. Sem necessidade de recorrer ao gore ou a efeitos especiais desnecessários, é a realização de Morales, numa hábil e segura mise-en-scène, que está na base do suspense que pouco a pouco se vai instalando no espírito do espectador.
Em "Los Ojos de Julia" Morales usa a cegueira não apenas como uma deficiência física propensa a abusos violentos, mas sobretudo como uma metáfora sobre a vulnerabilidade das pessoas, rodeadas pela indiferença e exclusão social. Simultaneamente, é essa mesma cegueira que está no centro da história de amor que é contada em paralelo e que culmina num final de rara beleza, algo nunca visto neste tipo de filmes. De realçar ainda a fotografia de Oscar Fauro, que de parceria com a cenografia (Didac Bono) e a música (Fernando Vélazquez), contribui decisivamente para a coerência de todos os ambientes do filme, onde predomina o bom gosto e, por vezes, até uma certa poesia.
Mas a grande força do filme reside sobretudo em Belén Rueda, simplesmente magnífica no papel de Julia Levin: ela é o centro em volta do qual tudo o mais gravita. Como se não bastasse ter tido a sorte de poder contar com a actriz perfeita para o papel perfeito, Morales soube rodear-se por uma equipa técnica de alto gabarito para desse modo conseguir atingir os seus propósitos: um filme de um suspense quase clássico, manipulador, por vezes desconcertante, e desenvolvido através de ambientes únicos, onde a tensão e a poesia se cruzam a cada passo, a cada sequência. “Los Ojos de Julia” não será votado ao esquecimento, como tantos filmes do género, e daqui a alguns anos poderá vir a constituir-se num autêntico filme de culto, uma espécie de giallo castelhano.
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