Um Filme de INGMAR BERGMAN
Com Max Von Sydow, Gunnar Björnstrand, Bibi Andersson, Bengt Ekerot, etc.
SUÉCIA / 96 min / PB / 4X3 (1.37:1)
Estreia na SUÉCIA a 16/2/1957
Estreia em PORTUGAL a 23/10/1963
Foi com 18 anos que o cinema de Ingmar Bergman começou a fazer parte da minha vida. O filme, já datado de quinze anos, foi "O Sétimo Sêlo". Nomeado para a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1957, viria a ganhar o Prémio Especial do Júri em parceria com o filme "Kanal", de Andrzej Wajda. Era o segundo filme de Bergman a ser conhecido para além das fronteiras do seu país natal, a Suécia. O primeiro tinha sido o "Sorrisos duma Noite de Verão" no ano anterior, que inaugurou também o cinema de Bergman em solo português: estreou-se no cinema Império, em Lisboa, no dia 17 de Fevereiro de 1960. Mas voltando ao "Sétimo Sêlo": vi-o em Lourenço Marques, no Estúdio 222 (anexo ao cinema Dicca), a 18 de Junho de 1971, uma sexta-feira à noite. O impacto que o filme teve nessa altura nos neurónios da minha geração, foi avassalador! Os jovens cinéfilos que grande parte de nós nos considerávamos, ávidos de coisas diferentes do habitual, sentiram de repente que estavam diante de algo muito especial e transcendental. Afinal o cinema não era só entretenimento, as grandes questões podiam ser também equacionadas face ao que nos era mostrado no grande écran: Deus e o Diabo, a Morte ou o Sentido da Vida. Foi um filme que, no meu caso pessoal, serviu de rastilho para começar a ver outros tipos de filmes e, sobretudo, a começar a ler tudo o que me aparecia pela frente sobre o cinema e o modo como os filmes eram feitos. Nunca mais parei...
Antonius Block: «Who are you?»
Death: «I am Death»
Antonius Block: «Have you come for me?»
Death: «I have long walked by your side»
Antonius Block: «I know»
Death: «Are you prepared?»
Antonius Block: «My body is frightened, but I am not»
“Det Sjunde Inseglet” (o título original em sueco) é, ainda hoje, um dos filmes mais conhecidos de Ingmar Bergman. Aclamado como uma obra-prima cinematográfica, o filme é uma alegoria magistral do homem à procura do significado da vida. Um cavaleiro, Antonius Block (Max Von Sydow), retorna das Cruzadas para casa e encontra o seu mundo destruído pela peste negra. A Morte aparece para levá-lo, mas Block recusa-se a morrer sem ter entendido o sentido da vida. Propõe então um jogo de xadrez, numa derradeira tentativa de enganar o grande ceifador. Apercebendo-se de que está em desvantagem Block tenta enganar a Morte virando o tabuleiro. Mas a Morte reconstitui o jogo, e o cavaleiro é obrigado a continuar a jogar.
Ao longo dos anos os críticos têm procurado respostas de todo o tipo, tentando explicar a profusão de alusões e alegorias que o filme encerra. O próprio Bergman referiu que o filme o ajudou a ultrapassar a angústia perante a morte, falando dele como uma superação: «Tinha medo daquele enorme vazio, mas a minha opinião pessoal é que quando morremos, morremos, e passamos de um estado de qualquer coisa para o estado do nada absoluto; e não acredito nem por um segundo que haja alguma coisa acima ou para além, ou como se queira dizer; e isso enche-me de segurança».
Obcecado pela representação da Morte nos frescos da Idade Média, Bergman insere aqui esse tema tantas vezes tratado nos seus filmes, inscrevendo-o num contexto religioso, que está na própria origem da sua obsessão. Mas a questão é posta por um homem moderno, retomando assim a atitude dos artistas e pensadores da Renascença, isto é, de uma época em que o espírito começou a derrubar as barreiras dogmáticas e místicas na procura do conhecimento. Essa procura do conhecimento levou o cavaleiro Block até à Terra Santa como era natural que acontecesse com um espírito inquieto daquela época. Voltou sem ter encontrado a resposta desejada. E a partida de xadrez é a última tentativa feita por Block para tentar descobrir os segredos da Vida e da Morte.
"O Sétimo Sêlo", meditação sobre a morte, é, paradoxalmente, a vitória da vida sancionada pelo amor. E o amor torna-se, assim, uma resposta a todas as interrogações. Os puros, os inocentes, são aqueles que amam. Basta tomarmos consciência deste facto para que essa Vida, ainda que absurda, visto conduzir ao nada, possa ser vivida plenamente. Bergman mostra-nos como o homem moderno se priva a si próprio da felicidade, teimando em procurar o irracional, e como também ele se torna masoquista por receio da morte e do que virá após ela. À humanidade do século XX, minada pela angústia de uma guerra atómica, tal como a humanidade da Idade Média o era pela peste apocalíptica, Bergman dá uma lição de vida, sem no entanto afirmar ou negar seja o que for. Como escreveu Eric Rohmer, «"O Sétimo Sêlo" é antes de tudo um filme onde o que vale não é tanto a originalidade da filosofia de Bergman... como a maneira precisa como ele conseguiu exprimir na tela todos os seus cambiantes.»
É particularmente significativo que Bergman tenha situado “O Sétimo Sêlo” num mundo tão marcado pela presença (“opressiva”, de várias maneiras) da religião, como era o mundo medieval. Voltando a citar o realizador, «a ideia de um Deus cristão tem algo de destrutivo e terrivelmente perigoso. Ele faz emergir um sentimento de risco iminente, e por consequência traz à luz forças obscuras e destrutivas». Enquanto vai descobrindo os aspectos mais hediondos do fervor religioso, Block toma quatro pessoas sob a sua proteção: o ateu Squire Jons, um casal de jovens saltimbancos, Mia e Jof, mais o seu bebé. Alguns críticos associam os nomes e a presença quase imune à morte do casal à Sagrada Família. No fim, como seria inevitável, Antonius Block perde a partida de xadrez. A Morte toma-o, a ele e aos seus, para os lançar numa dança macabra à qual o casal de actores consegue escapar. Através da representação do actor Bengt Ekerot, Bergman criou a mais célebre “encarnação” da morte de toda a história do Cinema. “O Sétimo Sêlo” é mesmo indissociável dessa figuração, que se fixou no imaginário colectivo do século XX. Este é o “filme da morte”, este é o “filme do jogo de xadrez”!
2 comentários:
Grande texto, a propósito de um grande, grande filme. Realização, fotografia, actores... Magistral.
Cumps.
Roberto Simões
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É um dos meus favoritos do mestre mas ainda luto para decidir entre este e o belíssimo "A Fonte da Virgem". Parabéns pelo post, parece que o blog volta a ter "novidades" com regularidade o que para mim é óptimo. Votos de um Bom Ano Novo.
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