Um filme de WIM WENDERS
Com Rüdiger Vogler, Yella Rottländer, Elizabeth Kreuzer, Edda Köchl, Ernest Boehm
RFA / 110 min / P&B /
4X3 (1.37:1)
Estreia na ALEMANHA a 17/5/1974
Estreia nos EUA a 9/10/1974
(New York Film Festival)
Philip 'Phil' Winter: «The inhuman thing about American TV is not so much that they hack everything up with commercials, though that's bad enough, but in the end all programmes become commercials»
“Alice nas Cidades” foi o primeiro filme da chamada trilogia da estrada de Wim Wenders. Os outros seriam “Movimento Falso” (1975) e “Ao Correr do Tempo” (1976). Desde sempre fascinado com as mitologias americanas Wenders criou o seu alter-ego em Rüdiger Vogler, actor que desempenhou na tela o(s) mesmo(s) papeis que o realizador alemão já vivera na realidade. Este Philip Winter tem muito de auto-biográfico, começando logo pela obsessão das fotos Polaroid: «Durante a minha viagem pelos Estados Unidos, tirei muitas fotos Polaroid, mas com o sistema antigo: tínhamos que esperar um minuto, antes que descobríssemos de uma vez a foto já revelada. Ouvíramos rumores que existia uma máquina fantástica que fazia fotos nas quais podíamos ver como é que elas iam aparecendo. Escrevemos à Polaroid e eles emprestaram-nos duas máquinas, muito antes de elas serem comercializadas. Ainda tenho a primeira foto que tirei, num café novaiorquino, com esta câmara.»
“Alice nas Cidades” é portanto um filme de um homem, um jornalista alemão, que tira fotos, muitas fotos Polaroid em terras do Tio Sam (abro aqui um pequeno parêntesis para reforçar a imagem da obsessão daquelas máquinas, aparecidas nos inícios dos anos 70. Eu tive uma e lembro-me muito bem do vício...). Na praia, nos cafés, nas estradas sem fim ou nos moteis sempre iguais, Winter vai usando a pequena máquina fotográfica («o resultado é sempre diferente daquilo que vemos...») como alternativa ao facto de não conseguir escrever uma linha sobre o trabalho jornalístico de que foi incumbido. Quem não acha graça nenhuma é o editor da agência de correspondência, que lhe nega adiantar mais dinheiro. Já com os poucos recursos a esgotarem-se, Winter não vê outra solução que não a de regressar à Alemanha. Devido a uma greve dos controladores os vôos encontram-se momentâneamente cancelados e no aeroporto Winter trava conhecimento com uma conterrânea sua, acompanhada da filha, Alice (Yella Rottländer).
Metidos no mesmo barco, resolvem passar a noite num hotel e apanharem no dia seguinte o primeiro vôo para a Europa. Só que Lisa (Elizabeth Kreuser), a mãe de Alice, tem assuntos amorosos por resolver e deixa um bilhete a Winter pedindo que tome conta da filha até se encontrarem mais tarde no aeroporto de Amsterdam. Esse encontro não irá acontecer e Winter vê-se a braços com a pequena Alice, uma situação a que não está de todo acostumado. E assim, de Amsterdam a Wuppertal, de Wuppertal ao Ruhr, Winter parte em busca da avó de Alice, único familiar com quem ela se lembra de viver alguns anos antes. Mas Alice confunde as cidades, as ruas, as casas, e o filme transforma-se numa longa busca, ao mesmo tempo que a relação entre os dois se vai desenvolvendo.
“Alice nas Cidades” é um filme em que aparentemente não se passa nada de extraordinário, há quase como que uma gratuidade de acontecimentos. Mas esse será porventura o seu maior fascínio. Frequentemente comparado com “The Kid”, de Chaplin, o filme esteve em riscos de nunca ter sido feito. Citemos Wenders, uma vez mais: «Tinha escrito a história – ainda não o argumento – e fui, a convite de um amigo, à estreia de “Paper Moon”, de Bogdanovich (tinha gostado muito de “The Last Picture Show”). Foi uma catástrofe: a história que eu tinha acabado de escrever assemelhava-se demais a “Paper Moon” – um tipo que viaja com uma rapariguinha e, no fim, a traz de volta à tia. Como no meu filme. Ainda por cima Tatum O’Neal parecia-se muito com a minha Alice e só Ryan O’Neal é que não se parecia exactamente com Rüdiger Vogler. Totalmente horrorizado, quis desistir de tudo e telefonei ao meu chefe de produção para cancelar o projecto. Fui, neste desespero, para Los Angeles e exibi os meus primeiros três filmes.
Tinha conhecido Sam Fuller quando ele filmou na Alemanha “Dead Pigeon on Beethovenstrasse”. Como estava em Los Angeles, telefonei-lhe. Ele convidou-me para tomar o pequeno almoço por volta das dez horas da manhã. Permanecemos sentados à mesa até à noite: milhares de pratos da maravilhosa cozinha judaico-polaca, muito vodka e, por fim, contei-lhe a história do meu filme que já não podia rodar por causa de Bogdanovich. Ele disse que algo assim também já lhe tinha acontecido. Ele tinha visto “Paper Moon” e não teve a paciência de me escutar até ao fim: «Pára, pára, já estou a ver o teu problema». E começou a contar-me o meu próprio filme, mas na sua versão. Já não tinha nada a ver com “Paper Moon”, não era já também inteiramente aquilo que eu tinha escrito, mas o filme tornou-se, de repente, outra vez possível. Nessa noite, ainda telefonei para a Alemanha a dizer que faríamos o filme».
3 comentários:
Do tempo em que Wim Wenders sabia fazer cinema...
O Falcão Maltês
Já não sabe mais, Nahud?
esse Nahud....
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