O NOSSO AMOR DE ONTEM
Um filme de SYDNEY POLLACK
Com Barbra Streisand, Robert Redford, Bradford Dillman, Lois Chiles, Patrick O'Neal, Viveca Lindfors, etc.
EUA / 118 min / COR / 16X9 (2.39:1)
Estreia nos EUA (NY) a 16/10/1973
Hubbell Gardner: «People are more important than their principles.»
Katie Morosky: «People ARE their principles.»
Com argumento tripartido entre Paddy Chayefsky, Arthur Laurents e Francis Ford Coppola, “The Way We Were” continua, meio século passado, a pertencer à categoria dos filmes românticos. Não é apenas um filme sobre a eclosão e o desenvolvimento de um relacionamento amoroso, é um pouco mais do que isso. Trata-se de uma história mais ou menos comum sobre o amor e as suas oscilações, devido às diferentes percepções da realidade do casal envolvido. O filme de Pollack apresenta-nos dois protagonistas centrais: Katie Morosky (Barbra Streisand), uma fervorosa militante comunista (tanto quanto o ser-se “comunista” nos EUA poderá significar), e Hubbell Gardiner (Robert Redford), um jovem pequeno-burguês pouco ligado a questões políticas e que se está mais ou menos marimbando para o mundo à sua volta. Ao longo da faculdade, no entanto, e por algum estranho motivo, cresce entre os dois um inesperado laço pessoal que os mantém unidos.
Durante a juventude, Katie admira e respeita o surpreendente talento de Hubbell enquanto escritor de ficção; do outro lado, o frívolo estudante e grande entusiasta de desportos, encanta-se pela eloquência e capacidade de mobilização de massas do discurso de Katie, mesmo não estando de acordo com o seu posicionamento político. Sómente anos depois, já nos momentos finais da Segunda Guerra Mundial, é que ambos os protagonistas se reencontram, despoletando uma chama até então apagada. Mas a descoberta inicial não dura muito e em breve irá dar lugar ao desapontamento.
Cabe aqui recordar a mais bela sequência do filme, mesmo tendo em conta aquele pungente final. Hubbell, chega ao apartamento de Katie completamente embriagado, e a primeira coisa que faz é ir vomitar para a casa de banho. Mas os efeitos do álcool permanecem e deixa-se caír, já despido, na cama de Katie. Passada a surpresa, esta despe-se também, muito lentamente para não perturbar o roncar do colega, e enfia-se com muito cuidado na metade desocupada da cama. Mais tarde o inevitável acontece, muito suavemente, mas Katie acredita que Hubbell a confunde com a namorada, Carol Ann (Lois Chiles). O novo dia traz-nos duas reacções diferentes dos dois amantes casuais. Hubbell parece confuso, não sabendo muito bem o que aconteceu (ou o que não aconteceu) e Katie, que muito provavelmente nunca tinha tido outro homem antes daquela noite, vê alcançado o seu desejo mais secreto. Mas nenhum dos dois fala sequer da situação.
A construção da relação entre Katie e Hubbell não é pautada apenas por um amor incondicional, muito pelo contrário. O que nos é aqui apresentado é uma tensão modulada a partir de uma potência juvenil. Entre eles saem faíscas que nem sempre são oriundas do amor. Existe, nesse relacionamento, uma constante transição entre dor, paixão e tristeza. Nada dentro do universo do filme é ideal, muito menos o amor; e essas faíscas ácidas de modo algum os deixam mais distantes. Por incrível que pareça, é exactamente isso que aparenta unir Hubbell e Katie. Superar tais crises cria, entre os dois, um irremediável desejo de querer construir um amor real, sujeito a momentos de turbulência que, ao fim e ao cabo, apenas o fortalecem. Não é um amor dos sonhos, mas pouco importa: é um amor. Se a juventude acabou e é já saudade, ambos não deixam pelo caminho a força motriz do seu relacionamento. Mesmo nas grandes crises não falta no casal uma motivação potente em contornar as adversidades e voltar ao estado de paixão.
Hubbell Gardiner e Katie Morosky não são uma sinfonia exacta. São como duas melodias distintas que se entrelaçam sem nenhuma explicação. Quem poderia imaginar que um homem desconectado da política fosse despertar uma ardente paixão numa dedicada militante comunista? Só o amor, e nada mais do que isso, é capaz de unir essas duas frequências dissonantes. Hubbell e Katie aparentam estar conectados por um cordão umbilical que transcende os limites da lógica. Observando ambos friamente, essa relação não faz sentido algum. Pensando racionalmente, são pessoas que ocupam espaços diametralmente opostos. Mas quem disse que o amor deve ser racional? Entre os personagens principais de “O Nosso Amor de Ontem” a razão é jogada no lixo, desprezada. O fogo que arde em ambos os protagonistas faz com que o insustentável seja, na verdade, aquilo que os mantém fortes e unidos.
Após alguns anos de harmonia e uma filha por nascer, Hubbell e Katie terminam a sua relação. O tempo encarregou-se de os tornar, teoricamente, em estranhos que carregam consigo os segredos um do outro. Hubbell distancia-se de vez, logo após o nascimento. Não nos é mostrado o que cada um deles irá fazer, mas é fácil adivinhar. Katie continuará a ser a mesma activista de sempre, independentemente da natureza das causas, e Hubbert seguirá o seu caminho de escritor e bon-vivant. No final teremos essa confirmação. E naquele último encontro casual, naquela troca de olhares, sabemos que a distância jamais será capaz de transformá-los em desconhecidos. O amor pode ficar adormecido, fechado a sete chaves nas profundezas de cada um deles. Mas qualquer pequena faísca bastará para que os dois possam vir a disfrutar de um pouco mais de felicidade no futuro. Por isso o final de “The Way We Were” não é definitivo: porque a vida é muito curta e o esquecimento muito longo…
CURIOSIDADES:
- Redford tinha 37 anos e Streisand 31 quando rodaram o filme. Idades bem avançadas para protagonizarem alunos de faculdade. Apesar do brilhantismo dos dois actores, é algo com que a equipa técnica não se preocupou, uma vez que nesse período os actores não foram devidamente “rejuvenescidos”.
- Quando inquirido numa entrevista o que Barbra Streisand estava vestindo na cama quando os seus personagens fazem pela primeira vez amor no filme, Robert Redford respondeu: «Apenas Chanel nº 5».
- Quando Barbra Streisand ouviu a canção-título pela primeira vez, fez duas sugestões importantes que a transformaram. Ela sugeriu uma ligeira mudança na melodia para elevá-la em um ponto crucial da canção, e também sugeriu mudar o primeiro verso de "Devaneios iluminam os cantos da minha mente" para "Memórias iluminam os cantos da minha mente".
- Sydney Pollack decidiu começar o filme com um prólogo antes dos títulos principais e da música-tema porque não queria que Barbra Streisand fosse apresentada ao público primeiro como cantora e não como personagem.
- No mesmo ano, 1973, o compositor Marvin Hamlisch e o actor Robert Redford também colaboraram em “The Sting / A Golpada”. Hamlisch ganhou Oscars por ambos os filmes.
- O filme ganhou 2 Óscares nas categorias musicais, banda-sonora e canção original (Marvin Hamlisch). Teve ainda mais 4 nomeações: Actriz Principal, Cinematografia, Direcção Artística e Guarda-Roupa.
- No ano do seu falecimento (2025) Redford deu uma última entrevista, na qual referiu Barbra Streisand como uma das 6 mulheres que o tinham marcado ao longo da vida.
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