Um filme de ABEL FERRARA
Com Zoë Tamerlis, Albert Sinkys, Darlene Stuto, Helen McGara, Nike Zachmanoglou, Jimmy Laine (Abel Ferrara), etc.
EUA / 80 min / COR / 4X3 (1.37:1)
Estreado nos EUA a 24/4/1981
Estreado em PORTUGAL a 13/11/1981
(Lisboa, cinema Odeon)
She was abused and violated. It will never happen again!
Mais um filme em que o móbil central é o da vingança de uma mulher. À semelhança da história de “I Spit On Your Grave”, a premissa em “Ms 45: Angel of Vengeance” é também uma dupla violação exercida sobre a mesma mulher (fora e dentro de portas). Mas as semelhanças ficam-se por aqui, como adiante se verá. Thana (interpretada pela actriz americana Zoë Tamerlis – ou Lund – nascida em Nova Iorque, a 9/2/1962 de mãe sueca e pai romeno; e falecida em Paris, a 16/4/1999), é uma costureira muda, empregada num atelier nova-iorquino, que num dia azarento é assaltada e violada num beco da cidade; como se tal não bastasse, ao chegar a casa sofre novo assédio sexual por parte de um assaltante que se consegue introduzir no seu apartamento. Do primeiro homem (interpretado pelo próprio Abel Ferrara) não mais se ouvirá falar; mas o segundo acaba morto às mãos de Thana (nome derivado do grego Thanatos, que significa morte), a qual, para se defender, golpeia-o na cabeça com um ferro de engomar. Para se desembaraçar do corpo corta-o em pedaços, colocando-os em diversos sacos de plástico no frigorífico para depois, pouco a pouco, os ir distribuindo pelos caixotes de lixo da cidade.
O argumento prossegue no mesmo tom, centrando-se em episódios mais ou menos sangrentos e traçando uma evolução psicológica demasiado galopante para a protagonista, que de jovem-caldinho-sem-sal passa em apenas meia dúzia de dias a mulher fatal, liquidando uma série de homens que de algum modo se lhe atravessam no caminho, lembrando-lhe não só os actos de que foi vítima mas sobretudo fazendo-a sentir que o seu estado psíquico se está a descontrolar rapidamente. Thana mata para se proteger a ela própria - não tanto como defesa de um qualquer acto iminente mas sim resguardando-se antecipadamente de uma agressão que a sua mente, cada vez mais perturbada, a faz acreditar ser de novo possível. Ou seja, enquanto que em “I Spit On Your Grave” tínhamos uma vingança directa sobre os responsáveis pelas violações, aqui essa vingança exerce-se indiscriminadamente. Não tem um objectivo particular, antes dispara, literalmente, em todas as direcções, percorrendo por várias vezes um caminho que vai da solidão do apartamento de Thana à hostilidade sempre presente nas ruas da cidade, até se consumir, já mergulhada em absoluta irracionalidade, na festa final do halloween.
Abel Ferrara, cineasta independente nascido na Bronx (em 19/7/1951), consegue ultrapassar o argumento um tanto ou quanto linear e superficial, por vezes incongruente, que Nicholas St. John, seu habitual colaborador, lhe atirou para as mãos; e fá-lo de forma convincente, tornando-o num filme cheio de interesse, por vezes mesmo cativante. O thriller aparentemente banal que “Ms 45: Angel of Vengeance” poderia ter sido, é moldado superiormente por Ferrara, que consegue incutir-lhe um estilo muito próprio, dominando eficazmente o ritmo, os ambientes ou a direcção de actores (a grande maioria não ultrapassa uma confragedora mediocridade, mas são exemplarmente resgatados pela sobriedade e segurança do realizador).
“Ms 45: Angel of Vengeance” é estilisticamente uma obra deveras curiosa e muito sugestiva (Quentin Tarantino que o diga), filmada como se de um filme fantástico se tratasse (Thana faz lembrar uma personagem de banda desenhada), tendo por cenário natural as ruas de Nova Iorque, a um tempo mórbidas e perigosas, como poucos cineastas tiveram o ensejo de as mostrar no grande écran. Por outro lado, Ferrara consegue operar uma transformação vampírica na sua heroína, para quem o crime se torna numa autêntica droga. Acompanhamos a sua descida aos infernos passo a passo (a câmara raramente se afasta dela), assistimos à sua degeneração num monstro frio e mecânico que espalha um ódio visceral pelo género homem com a ajuda de um símbolo fálico por excelência – aquele revólver 45, que paradoxalmente a liberta da timidez inicial para descobrir todo um poder de sedução até então adormecido.
Não se pode falar deste filme mítico sem invocar a mulher por detrás da sua trágica heroína – Zoë Lund, actriz, compositora, pianista, modelo, romancista, argumentista (seria a co-autora de outro filme de Ferrara, “Bad Lieutenant”) e activista política, que infelizmente morreu cedo demais, aos 37 anos, vitimada por uma overdose de heroína. Com uma filmografia escassa (apenas 6 longa-metragens), Zoë Lund, conhecida também como Zoë Tamerlis, tornou-se uma das figuras inesquecíveis do cinema fantástico. A sua beleza, frágil e serena, ficará para sempre ligada às personagens a que deu vida.
LOBBY CARDS:
Gostei muito de seu blog. Já o inclui entre os meus favoritos e vou colocar o 'link' na minha página.
ResponderEliminarme interessei pelo filme e pelo blog para download, já esta nos meus favoritos, vou baixar esse. Abs!
ResponderEliminarÉ mais uma das pérolas que por lá anda :)
ResponderEliminarGraças ao teu incentivo texto e sugestivas imagens, mais uma "novidade" que tenho de descobrir.
ResponderEliminarAbel Ferrara é um diretor diferente. Tem seu estilo de filmar e de apresentar histórias, que são sempre muito bem feitas e com sua marca. Isto acontece em toda sua filmografia, onde qualquer de seus filmes jamais recebe marcas negativas.
ResponderEliminarA atriz, Zoe Lound, que nos deixou aos 37, se parece bastante com as belas Lena Olin e mais ainda com Jeanne Tripppleborn, de Instinto Selvagem.
jurandir_lima@bol.com.br